AHA 2024: Uso de ciclossilicato de zircônio sódico para hipercalemia na IC
Os antagonistas do receptor mineralocorticoide (ARM) são fundamentais para o tratamento da insuficiência cardíaca com fração de ejeção reduzida (ICFER), com benefício em redução de morbimortalidade. Apesar disso, muitos pacientes não recebem a medicação e estudos observacionais sugerem que uma das causas é a hipercalemia.
Novos quelantes de potássio (K+) com melhor tolerabilidade intestinal podem tornar seu uso factível no longo prazo. Uma dessas medicações é o ciclossilicato de zircônio sódico (CZS) um cristal inorgânico que troca K+ por hidrogênio e sódio, administrado por via oral.
Neste congresso da American Heart Association foi apresentado o trabalho REALIZE-K, que avaliou a eficácia e segurança do CZS na otimização de ARM em pacientes com ICFER sintomática e hipercalemia.
Métodos do estudo e população envolvida
Foi estudo prospectivo, duplo cego, placebo controlado, randomizado que avaliou a possibilidade de otimização de espironolactona com uso de CZS em pacientes com ICFER e hipercalemia ou com alto risco para hipercalemia.
Foram incluídos pacientes de 8 países da Europa, América do Norte e América Latina. Para inclusão deveriam ser adultos com IC diagnosticada, fração de ejeção do ventrículo esquerdo (FEVE) ≤ 40%, sintomas em classe funcional (CF) II-IV da New York Heart Association (NYHA) em uso de IECA, BRA ou INRA e betabloqueador em doses estáveis por pelo menos 4 semanas.
Foram consideradas duas coortes
- Coorte 1: pacientes sem uso de ARM ou em uso de doses < 25 mg/dia de eplerenone ou espironolactona com evidência de hipercalemia, definida como K+ 5,1-5,9 mEq/L, e taxa de filtração glomerular (TFG) ≥ 30 mL/min/1,73 m².
- Coorte 2: pacientes em risco para hipercalemia, definida como história de K+ > 5 mEq/L nos últimos 36 meses e TFG ≥ 30 mL/min/1,73m² ou K+ 4,5-5 mEq/L com TFG 30-60 mL/min/1,73 m² ou idade > 75 anos.
Todos os pacientes passavam por período de run-in de 4-6 semanas, com otimização da dose de espironolactona e normalização do potássio com uso de CZS se necessário. Os que usavam eplerenone tinham a medicação trocada para espironolactona.
Na coorte 1 iniciava-se CZS na dose de 10 g 3x ao dia por 48 horas, com redução para 10 g 1x ao dia após correção do K+. Então, espironolactona era aumentada para 50 mg com ajustes da dose de CZS se necessário. Na coorte 2, espironolactona era iniciada e aumentada no período de run-in e, quando ocorria hipercalemia, administrava-se CZS de forma semelhante a coorte 1. Os que não desenvolviam hipercalemia eram excluídos do estudo.
Pacientes que estavam em uso de CZS e espironolactona ≥ 25 mg e manutenção de K+ na faixa normal entravam na fase do estudo duplo cego, placebo controlado e eram randomizados para receber espironolactona e CZS ou espironolactona e placebo por 6 meses.
O desfecho primário era ocorrência de resposta ótima ao tratamento, definida como K+ na faixa normal e ausência de necessidade de outras medidas para hipercalemia.
Resultados
Foram avaliados na fase de run-in 366 pacientes, sendo que 202 receberam o tratamento na fase de randomização. Desses, 171 completaram o seguimento de 170 dias, sendo 88 no grupo CZS e 83 no grupo placebo.
A maioria dos participantes eram homens, brancos, em CF II da NYHA. A FEVE média foi de 33% e a maioria (99%) estava recebendo IECA, BRA ou INRA, 71% estavam recebendo iSGLT2, 96% betabloqueadores, 57% diuréticos de alça e 53% ARM em dose baixa. Pacientes do grupo intervenção eram mais velhos e com TFG menor, tinham NTproBNP mais alto e usavam mais diuréticos de alça.
O uso da medicação levou ao controle do K+ em proporção maior de pacientes, sem necessidade de medidas para hipercalemia comparado ao placebo (71% x 36%, OR 4,45; IC95% 2,89-6,86, p < 0,001). O número de eventos adversos foi semelhante entre os grupos.
Comentários e conclusão: ciclossilicato de zircônio sódico para hipercalemia na IC
Neste estudo, o uso de um novo quelante de K+ levou ao maior alcance de normocalemia em pacientes em uso de espironolactona ≥ 25 mg/dia, sem necessidade de medidas adicionais para o controle de K+. Esses pacientes também demoraram mais para apresentar hipercalemia e para reduzir ou suspender a espironolactona quando comparado ao placebo.
Assim, a medicação foi eficaz em possibilitar a otimização da espironolactona em pacientes com ICFER de forma segura. Um ponto importante é que houve tendência a maior retenção hídrica nos pacientes que usaram a medicação, com níveis maiores de NT-proBNP.
Esse estudo teve pequeno número de pacientes e não teve poder estatístico para eventos clínicos, além de o seguimento ter sido bastante curto. Porém, parece que o uso desta medicação auxilia na otimização da espironolactona, medicação fundamental no tratamento da ICFER de forma segura.
Confira a cobertura do AHA 2024!
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