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Cardiologia22 setembro 2025

Anti-hipertensivos de manhã ou à noite para controle da HAS noturna? 

Estudo comparou os efeitos de diferentes horários de administração de medicamentos anti-hipertensivos em pacientes com hipertensão
Por Juliana Avelar

A hipertensão é um dos principais fatores de risco para doenças cardiovasculares. Atualmente, as diretrizes para manejo da hipertensão recomendam amplamente o uso de associações de anti-hipertensivos em pílula única como tratamento inicial, a fim de melhorar a adesão e aumentar a taxa de controle. 

A pressão arterial noturna, avaliada por meio da monitorização ambulatorial da pressão arterial (MAPA), é um indicador prognóstico mais sensível para eventos cardiovasculares do que a PA de consultório, a PA de 24 horas ou a PA diurna. Além disso, reconhece-se que uma queda noturna da PA inferior a 10% do valor médio diurno pode traduzir-se em maior risco de lesão de órgão-alvo e eventos cardiovasculares. 

No entanto, devido à dificuldade no manejo da PA noturna, o controle inadequado da PA durante a noite é particularmente comum em pacientes hipertensos em tratamento, com uma incidência entre 30% e 60%. Alcançar o controle da PA noturna tem potencial significativo para reduzir o risco de eventos cardiovasculares e mortalidade em pacientes hipertensos.  

Considerando o momento ideal para administração de agentes anti-hipertensivos, a cronoterapia anti-hipertensiva pode fornecer uma abordagem eficaz para o controle da PA noturna. Estudos demonstraram que a administração vespertina de medicamentos anti-hipertensivos pode ser mais eficaz do que a administração matinal para reduzir a PA de 24 horas, normalizar o ritmo circadiano e reduzir o risco de mortalidade cardiovascular. Entretanto, outras pesquisas indicam que o horário de administração não afeta significativamente os níveis pressóricos nem influencia desfechos cardiovasculares maiores. 

No estudo The Effects of Olmesartan/Amlodipine Administered in the Morning or at Night on Nocturnal Blood Pressure Reduction in Chinese Patients With Mild-Moderate Essential Hypertension (OMAN) Trial, foram comparados os efeitos da administração matinal versus ao deitar do comprimido de olmesartana-amlodipina na redução da PA noturna e na recuperação do ritmo circadiano em pacientes hipertensos, com o objetivo de fornecer novas evidências para a cronoterapia anti-hipertensiva e aprimorar o manejo da PA noturna. 

Métodos 

Estudo clínico prospectivo, multicêntrico, randomizado, aberto, em grupos paralelos e de superioridade foi conduzido em 15 hospitais na China, entre 1º de junho de 2022 e 30 de abril de 2024. Foram incluídos pacientes hipertensos, de 18 a 75 anos, sem tratamento anti-hipertensivo prévio ou que tivessem descontinuado o uso de anti-hipertensivos por 2 semanas.  

Os participantes elegíveis foram randomizados na proporção 1:1 para receber a medicação pela manhã (6h–10h) ou à noite (18h–22h). Cada participante recebeu 1 comprimido diário de olmesartana-amlodipina (olmesartana 20 mg e amlodipina 5 mg) como tratamento inicial por 4 semanas, com seguimento a cada 4 semanas por 12 semanas. 

Durante o seguimento, a dose de olmesartana-amlodipina foi ajustada com base nos valores da MAPA e da pressão arterial de consultório. O controle pressórico foi definido como: 

  • PA de 24h < 130/80 mmHg 
  • PA diurna < 135/85 mmHg 
  • PA noturna < 120/70 mmHg 
  • PA de consultório < 140/90 mmHg 

Na primeira visita de seguimento (semana 4), a dose de olmesartana-amlodipina foi aumentada para 1,5 comprimidos/dia nos pacientes com hipertensão mascarada não controlada ou hipertensão sustentada não controlada. 

Se a PA de consultório permanecesse não controlada após mais 4 semanas (semana 8), a dose de olmesartana-amlodipina era aumentada em mais 0,5 comprimido/dia. A adesão ao horário de administração, conforme randomização, foi registrada em cada visita de seguimento. 

Desfechos

O desfecho primário foi a diferença na variação da pressão arterial sistólica (PAS) média noturna, do início do estudo até 12 semanas. 

Os desfechos secundários incluíram: 

  • Redução da pressão arterial diastólica (PAD) noturna; 
  • Reduções na PAS e PAD de 24 horas, diurna, matinal e de consultório; 
  • Taxas de controle da PA pela MAPA e pela medida de consultório; 
  • Proporção de pacientes com queda noturna da PA inferior a 10% da média diurna; 
  • Redução da carga pressórica; 
  • Taxa de resposta ao tratamento (definida como PAS < 140 mmHg ou redução de 20 mmHg, e PAD < 90 mmHg ou redução de 10 mmHg); 
  • Proporção de pacientes que necessitaram de tratamento intensivo. 

Resultados 

Foram incluídos 720 participantes (média de idade, 55,5 anos; 409 homens e 311 mulheres). As características basais estavam balanceadas entre os grupos.

Os valores médios (DP) basais da PA nos grupos de administração matinal versus noturna foram: 

  • 24 horas: 148,0 / 91,4 mmHg vs 147,6 / 91,6 mmHg 
  • Diurna: 152,3 / 94,0 mmHg vs 151,5 / 94,0 mmHg 
  • Noturna: 138,4 / 85,4 mmHg vs 138,3 / 85,8 mmHg 
  • Consultório: 154,4 / 94,6 mmHg vs 154,3 / 95,1 mmHg 

A variação média (DP) da PAS noturna, do início até 12 semanas, foi significativamente maior no grupo de administração noturna do que no grupo matinal com diferença entre grupos de −3,0 mmHg com sigifnicância estatísticas. 

Na semana 12, o grupo de administração noturna apresentou reduções significativamente maiores em relação à linha de base para: 

  • PAD noturna: −1,4 mmHg  
  • PAS matinal: −3,1 mmHg  
  • PAD matinal: −2,7 mmHg  

Na semana 12, o grupo de administração noturna também apresentou: 

  • Melhor taxa de controle da PAS noturna: 79,0% (244 de 309) vs 69,8% (208 de 298). 
  • Melhor taxa de controle da PAS de consultório: 88,7% (274 de 309) vs 82,2% (245 de 298). 

Além disso, houve maior redução da carga pressórica noturna no grupo de administração noturna. 

A proporção de pacientes sem queda noturna de PA ≥ 10% da média diurna ou com aumento da PA noturna caiu de 53,3% para 36,9% no grupo noturno (P < 0,001), enquanto no grupo matinal não houve alteração significativa. 

Além disso, a PAS noturna e a PAS matinal foram menores no grupo noturno, indicando melhora significativa no padrão circadiano da PA. 

Quanto à taxa de resposta ao tratamento, uma proporção maior de pacientes do grupo noturno apresentou resposta favorável na PA de consultório na semana 12, sem diferenças nas semanas 4 ou 8. 

Não foram observadas diferenças significativas na prevalência de eventos adversos relatados ou de hipotensão noturna entre os grupos durante o seguimento. 

Baixa adesão ao horário de administração prescrito foi relatada por 4,5% (16 de 352) no grupo matinal e 5,4% (20 de 368) no grupo noturno. 

Discussão 

O estudo OMAN foi um ensaio clínico randomizado multicêntrico que investigou os efeitos da cronoterapia anti-hipertensiva usando uma combinação de ação prolongada em dose única como regime inicial de tratamento. O estudo constatou que a administração ao deitar pode controlar melhor a pressão arterial (PA) noturna e melhorar o ritmo circadiano em comparação com a administração matinal, sem comprometer a eficácia na PA média diurna ou de 24 horas, nem aumentar o risco de hipotensão noturna. 

Os resultados podem estar relacionados aos seguintes mecanismos potenciais: 

  1. Devido ao ritmo circadiano da PA, uma redução da PA noturna pode levar à diminuição da perfusão renal e à ativação do sistema renina–angiotensina–aldosterona. Portanto, tomar olmesartana ao deitar pode inibir melhor a ativação noturna desse sistema. 
  2. A anlodipina, quando administrada ao deitar, aproveita suas características farmacocinéticas, atingindo concentração máxima no sangue em 6 a 12 horas, potencializando seu efeito anti-hipertensivo à noite. Além disso, apresenta meia-vida e biodisponibilidade maiores quando administrada ao deitar, sugerindo maior absorção. 

Assim, a combinação de olmesartana e anlodipina pode controlar melhor a PA noturna e matinal e melhorar o ritmo circadiano da PA, sem reduzir a eficácia na PAS diurna ou de 24 horas. No nosso estudo, os pacientes do grupo de administração matinal receberam mais ajustes de dose. Esse achado sugere que a maior eficácia observada no grupo de administração ao deitar não se deve a doses mais altas de medicamento. 

Entre as limitações, destacam-se: 

  1. Inclusão apenas de participantes chineses sem doença cardiovascular, o que limita a generalização para outras etnias ou pacientes com doença cardiovascular. 
  2. Falta de ampla disponibilidade da MAPA na prática clínica e seu uso limitado em estudos de desfecho para determinar titulação de medicamentos. 
  3. Adesão ao horário de administração reportada pelos participantes, o que pode introduzir erro de medição. 
  4. Alta adesão observada no estudo de eficácia em curto prazo, que pode não refletir a realidade de estudos de longo prazo. 
  5. Resultados refletem o efeito da combinação olmesartana–anlodipina, não necessariamente aplicáveis a outras combinações ou anti-hipertensivos no contexto da cronoterapia. 
  6. Período de acompanhamento limitado a 3 meses, sem avaliação de desfechos cardiovasculares. 

Conclusões: Anti-hipertensivos de manhã ou à noite  

Neste ensaio clínico randomizado de cronoterapia anti-hipertensiva, a administração ao deitar proporcionou melhor controle da PA noturna e melhorou o ritmo circadiano, sem reduzir a eficácia na PA diurna ou de 24 horas, nem aumentar o risco de hipotensão noturna. Esses achados sustentam as potenciais vantagens da administração ao deitar e oferecem novas evidências para orientar futuras pesquisas sobre cronoterapia anti-hipertensiva.

Autoria

Foto de Juliana Avelar

Juliana Avelar

Médica formada pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Cardiologista pelo Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia

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