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Clínica Médica30 outubro 2024

Efeitos a longo prazo da empagliflozina na doença renal crônica com e sem diabetes

Estudo teve como objetivo avaliar o impacto da empagliflozina 10 mg/dia em pacientes com doença renal crônica (DRC) com ou sem diabetes.

Nos últimos cinco anos os inibidores de SGLT-2 ganharam ainda mais evidência por demonstrar seu benefício em termos de proteção renal em indivíduos com ou sem diabetes. Tudo começou a partir da análise de endpoints secundários dos estudos de segurança cardiovascular (CVOTs) das medicações da classe, que demonstraram um grande impacto em redução da albuminúria (estudos como o EMPAREG, da empagliflozina, CANVAS, da canagliflozina, e mais tarde o DECLARE-TIMI 68, da dapagliflozina). 

Posteriormente foram publicados os estudos específicos para avaliar desfechos renais e cardiovasculares (visto que a principal causa de mortalidade nesse grupo é de fato por tais doenças). Em 2019 veio o primeiro, o CREDENCE, porém que incluiu apenas indivíduos com DM2, mas demonstrando uma redução de 30% em desfecho composto por insuficiência renal (IR), duplicação da creatinina e morte por causas renais ou cardiovasculares (HR 0,70 (95% IC; 0,59–0,82). Logo depois, em 2020, o DAPA-CKD (2020), que incluiu indivíduos sem DM2 (em menor proporção), mas também demonstrando impacto muito positivo no desfecho primário, determinado pelo tempo para primeira ocorrência de queda na TFG ≥50%, IR ou morte por causas renais ou cardiovasculares, com um HR de 0,61 (IC 95%; 0.51– 0.72).  

Leia mais: Benefício da empagliflozina para crônicos renais e IC independe da gravidade?

Recentemente, em 2023, o estudo EMPA-KIDNEY foi publicado no New England Journal of Medicine (NEJM). O estudo teve como objetivo avaliar o impacto da empagliflozina 10 mg/dia em pacientes com doença renal crônica (DRC) com ou sem diabetes. Tal estudo incluiu ainda mais indivíduos sem diabetes (54%) e demonstrou redução do desfecho primário, de forma que foi indicado sua interrupção precoce devido ao benefício atingido no grupo intervenção. 

Agora, em outubro de 2024, foi publicado no NEJM um estudo de follow-up, sem intervenção, da coorte de pacientes do estudo EMPA-KIDNEY, com o objetivo de avaliar se os benefícios no uso da empagliflozina permaneceram mesmo após o final do período de intervenção. 

empagliflozina

Estudo original 

Vale a pena revisitar o estudo original, durante o período de intervenção. De forma resumida, o estudo foi um RCT, duplo cego, placebo controlado, multicêntrico. que incluiu participantes com TFG entre 20 e 45 ml/min ou entre 45 e 90 ml/min com razão albumina/creatinina urinária ≥ 200 mg/g. Os pacientes foram randomizados para empaglifozina 10 mg vs placebo.  

O endpoint primário do estudo foi um desfecho composto por progressão da doença renal (definida como doença renal em estágio final (ESRD), queda sustentada na TFG abaixo de 10 ml/min, queda sustentada da TFG maior que 40 ml/min ou morte por causas renais) OU morte por causas cardiovasculares. Os pacientes deviam estar em uso de iECA/BRA (a não ser que houvesse alguma contraindicação). Ao final, 6609 participantes foram randomizados, com um follow-up médio de dois anos. A média de idade foi de 63 anos, sendo 33% mulheres, apenas 4% negros, 54% não diabéticos e 34% com uma TFG menor que 30 ml/min, além de 20% com microalbuminúria A1.  

Durante o período de intervenção do estudo, o desfecho primário aconteceu em 432 dos 3304 pacientes do grupo empaglifozina (13,1%) versus 558 dos 3305 do grupo placebo (16,9%) – HR 0,72; 0,64 – 0,82; IC 95%; P<0,001). Os resultados foram consistentes independentemente de ter diabetes ou não e ao longo de todos os estratos de TFG (< 30, 30-45 e > 45 ml/min). Quanto aos desfechos secundários principais, houve redução na internação por todas as causas no grupo empaglifozina (HR, 0,86; 0,78 a 0,95; IC 95%; P=0.003).  

Métodos do follow-up 

O estudo de follow-up, publicado recentemente, foi um estudo observacional, sem intervenções, que buscou acompanhar os indivíduos de acordo com a sua randomização original no período intervenção (tanto os participantes como os pesquisadores continuaram cegos). 

Dos 6609 participantes do estudo de intervenção, 4891 (74%) continuaram na coorte de seguimento. O objetivo primário foi um desfecho composto por progressão de doença renal (definido como queda sustentada na TFG > 40%, desenvolvimento de ESRD, TFG sustentada < 10 ml/min ou morte por insuficiência renal) ou morte por causa cardiovascular, ou seja, o mesmo utilizado no estudo de intervenção. 

Como se tratou de um estudo observacional, não houve restrições quanto à prescrição open label de inibidores de SGLT-2 pelos clínicos assistentes dos participantes. Ao final, o uso da classe foi similar entre os grupos (43% no grupo empa vs. 40% no grupo placebo). 

A população do estudo se manteve similar, com média de idade de 63 anos, 66% masculinos, 42% com diabetes, TFG média de 36 ml/min e relação albumina/creatinina média de 212 mg/g (50% com albuminúria A3). 

Resultados 

A empagliflozina manteve o benefício cardiorrenal visto no estudo original, porém seu impacto caiu ao longo do tempo e as diferenças nos desfechos primários entre os grupos placebo e intervenção convergiram após 2 anos. 

A análise de todo o período (fase ativa + follow up) manteve a diferença significativa entre os grupos quanto ao desfecho primário: 

  1. Grupo empagliflozina: 26,2% 
  1. Grupo placebo: 30,3% (HR 0,79; IC 95%; 0,72-0,87)  

Quando considerado apenas o período de follow-up, sem intervenção (e, portanto, apenas com uso open label de iSGLT-2 em cerca de 40% dos participantes em cada grupo), os resultados foram os seguintes: 

  • Empagliflozina: 19,8% 
  • Placebo:  21,4% (HR 0,87; IC 95%; 0,76-0,99) 

Analisando a cada ano, após os primeiros seis meses o HR foi de 0,60, no primeiro ano o HR foi de 0,76 e após 2 anos de seguimento a diferença deixou de ser significativa. Vale lembrar que durante o período ativo do estudo, o HR foi de 0,72. Não houve diferença nos subgrupos (os resultados foram consistentes em indivíduos com ou sem diabetes e nos estratos de diferentes taxas de filtração glomerular). 

Quanto aos desfechos secundários, no período todo (intervenção + follow-up) houve também redução no risco de progressão da doença renal (de forma isolada, sem incluir morte por causas cardiovasculares), com HR 0,79. 

Saiba mais: A consolidação da empagliflozina na proteção da saúde cardiorrenal

Conclusão e mensagem prática 

A empagliflozina é uma medicação que se comprovou eficaz no tratamento da DRD, reduzindo desfechos importantes como os compostos renais e cardiovasculares. O estudo de seguimento pode demonstrar que, apesar de um “pequeno efeito legado” (uma vez que os efeitos de seu uso podem ser observados ao longo do primeiro ano após sua suspensão), o impacto da droga é maior quando o seu uso é realizado de forma contínua. De qualquer forma, trata-se de uma arma no arsenal terapêutico de uma condição que ficou por anos órfã de mudanças, seja para indivíduos com ou sem diabetes. 

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Referências bibliográficas

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