Prevalência e incidência de uveíte nas espondiloartrite na era biológica
As espondiloartrites (SpA) são um grupo de doenças que possuem como característica em comum a ocorrência de acometimento articular (axial ou periférico), cutâneo (psoríase), intestinal (doença inflamatória intestinal) e ocular (principalmente uveíte anterior aguda – UAA), além da importante associação com o HLA-B27. Desde a introdução dos medicamentos biológicos, houve uma grande revolução no tratamento das SpA, permitindo um controle mais intenso e prolongado da atividade da doença.
A UAA é a manifestação extra-musculoesquelética mais frequente das SpA, podendo acometer até 40% dos casos, especialmente aqueles com doença axial e HLA-B27 positivos. Dentre as opções terapêuticas, os anti-TNF monoclonais se mostraram eficazes em reduzir os ataques de UAA. O etanercepte, por outro lado, apresentou uma eficácia pior que os demais do grupo.
Por esse motivo, o uso mais irrestrito dos anti-TNF pode ter impactado na prevalência e incidência de UAA nos pacientes com SpA. Maldonado-Ficco et al. conduziram um estudo para avaliar essa possibilidade.
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Métodos
Trata-se de um estudo transversal utilizando dados retrospectivos do registro mundial de SpA denominado COMOSPA. Todos os pacientes preencheram os critérios de classificação ASAS, e os dados a respeito dos episódios de UAA, início dos sintomas da SpA e diagnóstico foram coletados.
Resultados
Foram incluídos 3984 pacientes, sendo 65% dos sexo masculino, com idade de início da SpA aos 28±13 anos e duração de doença de 8,2±9,4 anos.
Desses, 831 (20,9%) dos pacientes apresentaram pelo menos um episódio de UAA, com uma incidência de 3,3 primeiros episódios por 100 pacientes-ano. No momento do diagnóstico da SpA, a prevalência média de UAA foi de 10,5% (IC95% 9,5-11,4%). Após 10, 20 e 30 anos do diagnóstico, a prevalência aumentou para 23,2% (IC95% 21,4%-24,9%), 32,3% (IC95% 30,2-35,6%) e 46,6% (IC95% 41,6-51,5%), respectivamente.
A prevalência de UAA variou conforme as regiões. Ela foi mais alta na Europa (23,3%), seguida da Ásia (20,0%), África (19,9%), América Latina (17,0%) e Estados Unidos (15,3%).
Dentre os fatores associados à ocorrência de UAA, os fenótipos da da SpA tiveram influência: a prevalência foi maior naqueles com doença inflamatória intestinal (33,0% – 94,0% tinham doença axial concomitante), seguida da entesite periférica (23,0% – 89,0% tinham doença axial concomitante), doença axial (22,0%), doença articular periférica (19,0%), dactilite (19,0%) e psoríase (13,0%). Na análise multivariada, positividade para o HLA-B27, história familiar de uveíte, entesite periférica e doença inflamatória intestinal se associaram de maneira independente com a ocorrência de UAA.
Com relação ao impacto dos biológicos no risco de desenvolvimento de UAA, os autores restringiram a análise aos primeiros 10 anos, já que a prevalência de UAA aumentou com o passar do tempo. A frequência de UAA nos pacientes que iniciaram sua doença na era biológica (a partir de 2000, houve o lançamento dos biológicos para uso clínico) foi menor do que naqueles que iniciaram sua doença ante dos anos 2000 (8,2 vs. 25,5%, p<0,001), com um RR de 0,45 (IC95% 0,36-0,56). A taxa de incidência de UAA foi de 2,8 por 100 pessoa-ano na era biológica, enquanto que essa taxa foi de 6,1 por 100 pacientes-ano antes dos anos 2000.
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Comentários
Esse estudo é interessante por demonstrar que o tratamento apropriado das SpA com biológicos é capaz de reduzir a incidência e a prevalência da UAA nesses pacientes. Isso está, de fato, em consonância com o que observamos na prática clínica.
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