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Clínica Médica7 novembro 2024

Vedolizumabe e Clostridioides difficile na doença inflamatória intestinal

Revisão sistemática teve por objetivo avaliar a incidência de iCD entre adultos e adolescentes portadores de doença inflamatória intestinal expostos ao VDZ.
Por Leandro Lima

As doenças inflamatórias intestinais (DII), como a retocolite ulcerativa (RCU) e a doença de Crohn (DC), são condições crônicas que podem cursar com recidivas-remissões ou evolução progressiva, estando atreladas à elevada morbidade, incluindo o potencial para internações ou cirurgias diante de complicações.  

O arsenal terapêutico moderno, especialmente a partir do advento da terapia biológica, trouxe uma melhora expressiva do prognóstico da DII. Entretanto, pelos efeitos imunossupressores esperados com o tratamento, deve-se sempre manter a vigilância para a ocorrência de malignidades e infecções oportunistas. 

Na balança entre os benefícios vs. riscos da terapia biológica, uma avaliação necessária é aquela entre o vedolizumabe (VDZ), uma droga que se destaca pela segurança sob o aspecto de imunossupressão sistêmica, e a ocorrência de infecção pelo Clostridioides difficile (iCD), a principal causa de infecção oportunista entre os portadores de DII. Para se ter uma ideia mais ampla, o risco de iCD ao longo da vida nesse grupo é de 10%, o que equivale a 8 vezes o esperado para a população geral. 

Saiba mais: Desafios no tratamento das doenças inflamatórias intestinais: como romper o teto terapêutico?

O VDZ é um anticorpo monoclonal direcionado à integrina α4β7, expressa em linfócitos T residentes do intestino, impedindo a ligação à molécula-1 de adesão da célula de adressina da mucosa (MAdCAM-1), o que lhe confere vantagens únicas pela atuação específica no intestino, diferentemente dos outros biológicos. De toda maneira, estudos de fase III demonstram que a atuação localizada do VDZ aumenta o risco de infecções gastrointestinais em relação ao placebo. 

A revisão sistemática e meta-análise inaugural conduzida por Chen e colaboradores, publicada em outubro/2024 no BMC Gastroenterology, teve por objetivo avaliar a incidência de iCD entre adultos e adolescentes portadores de DII expostos ao VDZ.  

Foram excluídas as indicações de VDZ por pouchite refratária ou profilaxia de recidiva pós-operatória, bem como o seu emprego entre os transplantados hepáticos e os expostos à terapia biológica combinada.    

O desfecho primário foi a incidência de iCD, enquanto os desfechos secundários foram a incidência de iCD grave (leucocitose > 15.000/mm³, creatinina > 1,5 mg/dL ou necessidade de internação hospitalar) e a razão de risco de iCD em pacientes tratados com VDZ em comparação a outras drogas.   

Utilizou-se a metodologia PRISMA, tendo a busca nas bases de dados MedLine, Embase, Cochrane e clinicaltrials.gov sido realizada até setembro/2023. Entre 338 estudos triados, 30 foram selecionados, sendo a maioria coortes retrospectivas. Foram contabilizados mais de 40.000 pacientes provenientes da Europa, América do Norte, Oceania, Israel, Ásia e América do Sul, incluindo uma única coorte retrospectiva brasileira com N de 90 (Perin, 2019)  

A proporção agrupada de iCD foi de 0,013 (IC 95%: 0,010 a 0,017), enquanto a de iCD grave foi de 0,004 (IC 95%: 0,002 a 0,008). Por sua vez, a incidência agrupada de iCD e iCD grave foi de 1,27 e 0,59 casos por 100 pessoas-ano, respectivamente.  

A razão de risco comparativa de iCD entre os subgrupos de pacientes expostos ao VDZ com RCU vs. DC foi de 2,25 (IC 95%: 1,73 a 2,92). A maior prevalência de iCD já é esperada na RCU, em virtude do envolvimento predominantemente colônico, em comparação à DC.  

Já a razão de risco para iCD na vigência de VDZ, em comparação aos agentes anti-TNF, foi de 0,15 para RCU (IC 95%: 0,04 a 0,63) – um fator de proteção; e 1,29 para DC (IC 95%: 0,41 a 4,04). A maior segurança do VDZ na RCU, em relação ao anti-TNF, é apoiada na maior eficácia da terapia anti-integrina na RCU do que na DC. Esses dados devem ser avaliados sob a perspectiva de que se espera, com a maior taxa de cicatrização da mucosa, uma redução na incidência de iCD. 

As principais limitações desta revisão sistemática e meta-análise foram as pequenas amostras e números limitados de estudos; o tempo curto de seguimento dos pacientes, com média de 1,48 anos, considerando os estudos em que esse dado foi apresentado; a grande heterogeneidade entre os estudos; a incorporação da iCD apenas como desfecho secundário na maioria dos estudos e a ausência de descrição sobre os métodos diagnósticos empregados para iCD, por exceção de um único estudo.  

Veja também: Clostridiodes difficile: os principais equívocos

doença inflamatória intestinal

Conclusão e mensagens práticas 

  • A terapia biológica é um alicerce importante no tratamento da doença inflamatória intestinal (DII) moderada a grave. Entretanto, deve-se sempre ponderar os benefícios e riscos, com base nos efeitos imunossupressores relacionados à terapia.  
  • O risco geral de infecção pelo Clostridioides difficile (iCD) entre os portadores de DII expostos ao vedolizumabe (VDZ) foi estimado em 1,3% neste estudo, enquanto o risco de apresentações graves foi de 0,4%.  
  • O VDZ ofereceu vantagens sobre os agentes anti-TNF, com efeitos protetores para iCD, no subgrupo de pacientes com RCU.   
  • A análise da iCD entre os portadores de DII é uma tarefa complexa, pois envolve fatores de confusão variados, como subtipo, fenótipos e grau de atividade da DII, além das terapias empregadas, motivo pelo qual é desejável estudos futuros, com desenhos direcionados ao tema para agregar consistência às atuais evidências.  
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Referências bibliográficas

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