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Formação10 maio 2023

Competição com a rede privada e condições de trabalho afastam residentes do SUS

A pesquisa demográfica médica 2023 trouxe respostas sobre a distribuição de residentes pelo país e o trabalho no SUS.

Por Úrsula Neves

Dados da pesquisa Demografia Médica 2023, conduzido pelo Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), indicam que menos de um quarto dos médicos do país trabalham unicamente no SUS, independentemente de serem especialistas ou não, ou de terem prestado residência.  

Ainda conforme o levantamento, 24,6% dos médicos residentes entrevistados, após o prazo de um ano de residência, afirmaram trabalhar na maior parte do tempo ou integralmente no SUS. Cinco anos depois, esse percentual caiu 12%.  

Saiba mais: Trabalho de parteiras é reconhecido pelo SUS

Competição com a rede privada e condições de trabalho afastam residentes do SUS

Competição com a rede privada e condições de trabalho afastam residentes do SUS

Como foi o estudo 

O estudo, que ouviu 1.614 médicos residentes por telefone, com a aplicação de um questionário com 32 perguntas, ainda apontou um grande desequilíbrio na distribuição dos residentes pelo país.  A maior concentração está na região Sudeste (56%), seguida pelo Nordeste (17%), Sul (16%), Centro-Oeste (8%) e Norte (4%). Os estados de Roraima e Amapá concentram menos de 100 residentes somados.  

Depoimentos  

A residente de clínica médica no Complexo Hospitalar de Niterói (CHN) Laís Lopes Pires contou, em entrevista ao portal da PEBMED, que a infraestrutura e as condições de trabalho foram os principais fatores que a levaram escolher atuar em uma instituição privada.  

“Em hospitais privados, temos acesso à tecnologia e recursos de alta complexidade. Percebo que o academicismo, que antigamente era quase exclusivamente característico dos hospitais universitários, vem se expandido e se tornando mais comum nas instituições particulares. Na minha residência, por exemplo, tenho um preceptor que foi professor universitário que torna o “round” em excelentes discussões acadêmicas. Além disso, fazemos sessões clínicas semanais e discussões de casos em equipe, inclusive com apresentação de casos “desafio” para desenvolver o raciocínio clínico de diagnóstico. A presença do residente nos hospitais particulares tem se tornado mais frequente e, consequentemente, isso contribui para reforçar o papel do residente nesses ambientes. A união de um serviço estruturado de alta complexidade associada a ampla disponibilidade de recursos e uma preceptoria de qualidade tem se tornado um grande atrativo como possibilidade de residência médica”, analisou Laís Pires.  

Uma plantonista de terapia intensiva na mesma instituição privada que Laís, a médica Gabriela Lourenço de Carvalho e Gonçalves, também destaca a maior disponibilidade de recursos, além de maior certeza da efetivação do pagamento como os dois motivos que mais a atraíram para a rede privada.  

“Por outro lado, penso que fazer residência no SUS pode favorecer o nosso contato com uma realidade mais ampla, pois aprendemos a lidar com situações de saúde mais complexas, além de contar também com a expertise dos professores e médicos”, pontuou Gabriela Gonçalves, em entrevista ao portal.  

Leia também: 32 anos da Lei Orgânica do SUS: o desafio de retenção de profissionais da medicina

Setor privado busca profissionais de especialidades pró-sistema público 

O médico sanitarista e professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Adriano Massuda, afirmou que o setor privado tem mostrado interesse em áreas predominantes do serviço público, como medicina de família, medicina preventiva e social e infectologia. Conforme Massuda, o setor privado tem reconhecido a importância do trabalho dos médicos de família e começado a contratar profissionais dessa especialidade. 

O editor de Medicina de Família e Comunidade do Portal PEBMED, Marcelo Gobbo Jr., concorda com essa nova perspectiva do mercado de saúde suplementar.  

“O setor de saúde suplementar tem enfrentado graves dificuldades em relação à sua sustentabilidade e viabilidade. Como forma de estruturação dos sistemas, uma migração de perspectivas de pagamento sob demanda para pagamento por geração de valor tem sido realizada em todo o país ao longo dos últimos anos. A pandemia de covid-19 mostrou o impacto da ausência dessas perspectivas intensificando em muito a inflação médica em todo o país e ao redor de todo o mundo. Como medida para mitigação desse risco, a utilização de ações de saúde populacional tem sido a grande saída dos planos de saúde e demais operadoras de saúde. Essas medidas já são amplamente conhecidas em sistemas públicos universais de saúde que se organizam a partir de atenção primária à saúde. Enquanto o setor privado não formou esses profissionais com experiência nas últimas duas décadas, há 30 anos o SUS vem consolidando essa abordagem, tendo como pressuposto de sua metodologia de trabalho a formação profissional e qualificação continuada dos recursos humanos com esse olhar”, analisou Marcelo Gobbo Jr. 

Este artigo foi revisado pela equipe médica do Portal PEBMED.

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