Quais os efeitos dos “medicamentos Z” para pessoas com demência?
A insônia é um distúrbio comportamental comum na demência, frequentemente tratada com os chamados “medicamentos Z”. Quais os efeitos?
A insônia é um distúrbio comportamental comum na demência, frequentemente tratada com os chamados “medicamentos Z” (zolpidem, zopiclona, eszopiclona, zaleplon).
Evidências advindas de estudos observacionais sugerem que esses medicamentos estão associados a eventos adversos, como quedas, em idosos. No entanto, essas medicações ainda não haviam sido estudadas em pacientes com demência.
Medicamentos Z, sono e demência
Um estudo de coorte analisou dados de 27.090 pacientes com diagnóstico de demência, entre março de 2016 e janeiro de 2000, na Inglaterra.
Foram identificados pacientes com diagnóstico prévio de demência para inclusão no estudo, com base no registro deste diagnóstico em prontuário, ou em função de prescrição de medicações utilizadas em quadros de déficit cognitivo (memantina, donepezila , rivastigmina ou galantamina).
A variável de exposição a ser investigada era a administração de uma das medicações Z.
A população foi subdividida em pacientes com:
- Prescrição de um medicamento Z;
- Prescrição de benzodiazepínico;
- Diagnóstico de distúrbios do sono, porém sem prescrição de medicamento sedativo-hipnótico.
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Os critérios de exclusão foram:
- Menos de 12 meses de dados no histórico médico;
- Prescrição de sedativo-hipnótico nos últimos 12 meses;
- Diagnóstico prévio de apneia do sono, insuficiência respiratória relacionada ao sono, ou abuso de álcool;
- Prescrição de múltiplos sedativos-hipnóticos;
- Prescrição recente de antipsicóticos ou antidepressivos tricíclicos de baixa dosagem (≤ 25 mg de amitriptilina ou ≤ 50 mg de trazodona por dia).
Para testar a relação dose-resposta, foi determinado o número de doses diárias definidas (DDD) de drogas Z e benzodiazepínicos em cada prescrição. O DDD é a dose de manutenção média presumida por dia para um medicamento, com base em sua indicação principal em adultos.
Foram usados como base para os valores DDD: zopiclona 7.5 mg, zolpidem 10 mg, e zaleplon 10 mg por dia. Dados de frequência de dosagem ausentes foram assumidos como uma vez ao dia.
Resultados
Os desfechos primários foram, em ordem de importância:
- Incidente;
- Fratura em qualquer local;
- Fratura de quadril;
- Fratura de antebraço/punho/mão;
- Queda incidente;
- Mortalidade;
- Infecção bacteriana aguda;
- Acidente vascular cerebral isquêmico/ataque isquêmico transitório;
- Tromboembolismo venoso;
- Número de internações hospitalares e consultas médicas;
- Nova prescrição de antipsicóticos, antidepressivos e antibióticos.
Discussão
Havia 51.117 pacientes com demência no banco de dados. Destes, 3.532 pacientes haviam recebido drogas Z, enquanto 5.172 receberam benzodiazepínicos, de forma recente. Esses novos usuários de drogas Z e benzodiazepínicos foram pareados com um grupo controle de pacientes não usuários destas medicações, conforme previsto no planejamento inicial do estudo.
Foram encontradas evidências de aumento no risco de quedas, fraturas, e acidente vascular cerebral isquêmico em pessoas com demência que receberam prescrição de medicações Z em altas doses.
Veja mais: Sono e envelhecimento [parte 2]: Abordagem e tratamento da insônia crônica em idosos
O mesmo aumento desses riscos foi observado com o uso de benzodiazepínicos em altas doses. Uma em cada seis prescrições de medicamentos Z foi iniciada com doses consideradas altas, equivalentes a 7,5 mg de zopiclona por dia.
Idosos com demência que receberam prescrição de drogas Z em doses altas também tiveram maior probabilidade de precisar de hospitalização, ou de necessidade de agendar consulta com seu médico de família. Além disso, nos atendimentos médicos, esses pacientes apresentaram maior probabilidade de receber prescrição de antipsicóticos, antidepressivos, e antibióticos. A despeito desses desfechos desfavoráveis, não foi observado aumento de mortalidade, infecção ou tromboembolismo venoso com o uso de drogas Z.
Conclusão
Doses altas de drogas Z devem ser evitadas em idosos com demência, devido ao aumento do risco de quedas, fraturas, e acidente vascular cerebral. Os achados do estudo sugerem que o risco associado ao uso dos medicamentos Z são semelhantes ao dos benzodiazepínicos, em pacientes com demência.
Assim, devemos evitar essas medicações, buscando outras opções para o controle dos sintomas neurocognitivos apresentados nos pacientes com demência.
Referências bibliográficas:
- Richardson, K., Loke, YK, Fox, C. et al. Efeitos adversos dos medicamentos Z para distúrbios do sono em pessoas que vivem com demência: um estudo de coorte de base populacional. BMC Med 18, 351 (2020). https://doi.org/10.1186/s12916-020-01821-5
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