Endometrite crônica e a falha reprodutiva recorrente
A endometrite crônica é uma inflamação leve e persistente da mucosa endometrial de possível origem infecciosa bacteriana. Atualmente não existe uma definição padronizada para a endometrite crônica, mas a presença de numerosos plasmócitos no estroma é o achado mais acurado para o diagnóstico desta condição. Segundo alguns estudos, ela está associada a desfechos reprodutivos desfavoráveis, porém, ainda não há uma recomendação clara sobre a necessidade de sua investigação inicial em casos de infertilidade. Acredita-se que a inflamação crônica possa romper o equilíbrio imunológico do endométrio durante a implantação e estágios iniciais da gestação.
Uma revisão sistemática e metanálise publicada em agosto de 2024 na Frontiers in Immunology investigou a possível relação entre endometrite crônica e várias desordens reprodutivas femininas como infertilidade, falha de implantação e perda gestacional recorrentes e pretendemos abordar aqui os principais achados.
Metodologia
Todos os estudos que analisaram a correlação entre endometrite crônica e perda gestacional e falha de implantação recorrentes e infertilidade foram incluídos. Foram selecionados estudos de 1990 a fevereiro de 2024 de cinco bancos de dados eletrônicos: PubMed, Scopus, Web of Science, ScienceDirect e Cochrane Library. Dos 3.004 artigos relevantes, nove preencheram os critérios para inclusão. No total, 1.038 mulheres fizeram parte da amostra, destas 185 tinham infertilidade, 63 com história de falha de implantação recorrente, 489 diagnosticadas com perdas gestacionais recorrentes e 486 mulheres saudáveis usadas como controle do estudo.
A infertilidade foi definida como a incapacidade de engravidar após doze meses de relações sexuais regulares desprotegidas. A falha de implantação recorrente foi caracterizada como a inabilidade de atingir a gravidez após dois ciclos de transferência embrionárias ou três ou mais a depender do autor. A definição de perda gestacional recorrente variou muito entre os estudos selecionados. Quatro definiram como duas ou mais perdas enquanto outros consideraram três ou mais perdas.
Também se observou nesta revisão sistemática a falta de uniformidade para definição de endometrite crônica (inclusive a falta de consenso sobre o número de plasmócitos para diagnóstico).
Foi observada nesta metanálise uma associação entre endometrite crônica e infertilidade. A razão de chances foi de 2,96 (IC 95% 1,53-5,72, p 0,01) quando comparada aos controles. Também foi vista associação com a perda gestacional recorrente. Para este desfecho a razão de chances foi de 3,59 (IC 95% 2,46-5,24, p < 0,00001).
Não foi observada associação entre endometrite crônica e falha de implantação recorrente e deve-se levar em consideração o pequeno tamanho amostral como limitação neste desfecho estudado.
Leia também: Manejo de endometriomas: revisão sistemática e metanálise
Os dados epidemiológicos atuais mostram grande heterogeneidade com relação à prevalência da endometrite crônica entre mulheres com infertilidade variando de 2,8% a 56,8%, enquanto naquelas com falha de implantação recorrente variou de 14% a 67,5% e nos casos de perdas gestacionais variou de 9,3% a 67,6%.
Determinar a prevalência de endometrite crônica ainda é um desafio. Inicialmente pela dificuldade de se obter amostras teciduais de mulheres saudáveis. Além disso, cerca de 25% das mulheres são assintomáticas ou podem se apresentar com sintomas inespecíficos que podem não ser notados por longos períodos.
Ainda se faz necessária uma padronização internacional sobre a definição de endometrite crônica.
Resumo e mensagem prática
A endometrite crônica pode estar relacionada com falhas reprodutivas significativas, especialmente infertilidade e perdas gestacionais recorrentes. Esta metanálise ratifica dados já existentes da literatura. Estabelecer critérios internacionais para o diagnóstico da endometrite crônica é fundamental para guiar o diagnóstico clínico e manejo das mulheres com desordens reprodutivas.
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