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Oftalmologia4 novembro 2025

Álcool polivinílico no olho seco pós-catarata: efeito clínico e inflamatório

Estudo avalia o efeito do álcool polivinílico no olho seco pós-catarata. Veja os resultados e atualize sua conduta clínica!
Por Alléxya Affonso

A catarata permanece como uma das principais causas de deficiência visual em todo o mundo. A cirurgia de catarata pode impactar a superfície ocular, levando a lesões nas terminações nervosas da córnea, redução da densidade de células caliciformes e alteração da dinâmica do filme lacrimal, que frequentemente resultam em sintomas de olho seco pós-operatório, como fotofobia, sensação de areia, ardência e visão turva. Esse desconforto pode comprometer a recuperação e afetar a satisfação do paciente, mesmo diante de um resultado cirúrgico anatomicamente perfeito. 

No contexto da doença do olho seco pós-catarata, o tratamento costuma incluir lágrimas artificiais e agentes anti-inflamatórios. Entre as formulações disponíveis, o álcool polivinílico (PVA) é um dos polímeros mais utilizados devido à sua capacidade de manter a superfície ocular lubrificada, formando uma película hidrofílica que reduz a evaporação da lágrima.  

Apesar de seu uso disseminado, há poucas evidências sobre como o PVA influencia mediadores inflamatórios da superfície ocular, especialmente citocinas como CCL1, IL-13 e IL-10, que desempenham papéis fundamentais no equilíbrio entre inflamação e reparo tecidual. 

Com o objetivo de aprofundar esse entendimento, Wu e Hao em 2025 publicaram o estudo “Clinical effectiveness of polyvinyl alcohol in post-cataract dry eye and their effects on CCL1, IL-13 and IL-10 tear levels” na Pakistan Journal of Pharmaceutical Sciences. O trabalho avaliou, de forma prospectiva e randomizada, a eficácia clínica e os efeitos biológicos do PVA em pacientes com olho seco após cirurgia de catarata, correlacionando a melhora sintomática e funcional com alterações nos níveis de citocinas lacrimais. 

Veja também: Cirurgia de catarata aumenta qualidade e quantidade do sono

olho seco pós-catarata

Métodos  

Estudo duplo-cego, no qual foram incluídos 100 pacientes com olho seco após cirurgia de catarata, atendidos no Hospital Central Jiaozhou de Qingdao entre janeiro de 2021 e janeiro de 2023. Os participantes foram distribuídos aleatoriamente em dois grupos: um grupo controle, que recebeu o tratamento pós-operatório padrão com colírios de tobramicina-dexametasona, e um grupo experimental, que recebeu o mesmo protocolo acrescido do uso de colírio de PVA por dois meses.  

Os desfechos avaliados incluíram tempo de ruptura do filme lacrimal (BUT)teste de Schirmercoloração com fluoresceína e pontuação OSDIalém da mensuração de citocinas lacrimais (CCL1, IL-13 e IL-10) como marcadores inflamatórios. 

Resultados  

Os grupos eram comparáveis no início do estudo, sem diferenças significativas em idade, gênero ou gravidade do olho seco. Após o tratamento, o grupo que utilizou colírio de PVA apresentou uma eficácia clínica global significativamente maior (96%) em comparação ao grupo controle (88%).  

Além da melhora nos sintomas e parâmetros do olho seco, o grupo tratado com PVA também mostrou maiores reduções nos níveis de citocinas inflamatórias (CCL1 e IL-13) e aumento de IL-10, uma citocina anti-inflamatória. Nenhum evento adverso grave foi registrado.

Discussão  

A doença do olho seco no pós-operatório de catarata continua sendo um desafio clínico frequentemente subestimado. Apesar dos avanços cirúrgicos e da redução do tempo de facoemulsificação, a perturbação da homeostase da superfície ocular permanece inevitável.  

A secção dos nervos corneanos durante as incisões limbares e a inflamação desencadeada pela cirurgia iniciam uma cascata de alterações que incluem redução da sensibilidade corneana, diminuição do reflexo lacrimal, perda de células caliciformes e desestruturação do filme lacrimal.  

Esse conjunto de eventos justifica a alta incidência relatada de doença do olho seco após cirurgia de catarata, frequentemente atingindo seu pico em torno de um mês do pós-operatório. 

O estudo analisado destaca o papel do PVA como um agente eficaz na estabilização do filme lacrimal e na modulação da resposta inflamatória da superfície ocular. O PVA, por sua natureza hidrofílica e viscosidade intermediária, simula a função das mucinas e cria uma película protetora sobre o epitélio corneano, prolongando o tempo de permanência da lágrima e reduzindo a evaporação.  

Diferentemente de formulações contendo carbômeros ou lipídios, o PVA apresenta excelente tolerabilidade e mínima interferência visual, fatores relevantes no contexto pós-operatório. 

A ausência de efeitos adversos relatados ao longo de dois meses de uso reforça o perfil de segurança e biocompatibilidade do PVA 

Limitações  

  • Tamanho amostral reduzido. 
  • Ausência de estratificação por subtipo de doença do olho seco.  
  • O acompanhamento de apenas dois meses não permite avaliar potenciais efeitos tardios nem a durabilidade dos benefícios observados. 

Mensagem Prática 

As evidências apresentadas consolidam o PVA como uma opção segura, acessível e eficaz para o manejo do olho seco induzido por cirurgia de catarata. Sua ação combinada, lubrificante, protetora e potencialmente imunomoduladora, contribui para restaurar a homeostase da superfície ocular e melhorar o conforto pós-operatório.  

Dada sua boa tolerabilidade, biocompatibilidade e relação custo-benefício, o PVA se destaca como adjuvante valioso nos protocolos de recuperação da superfície ocular após facoemulsificação.  

Autoria

Foto de Alléxya Affonso

Alléxya Affonso

Graduada em Medicina pela Faculdade de Medicina Souza Marques (RJ) ⦁ Título de especialista pelo Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO) ⦁ PhD em Oftalmologia e Ciências Visuais pelo programa de Doutorado da UNIFESP/EPM ⦁ Membro Titular da Sociedade Brasileira de Retina e Vítreo (SBRV) ⦁ ​Especialista em Retina Clínica, Uveítes e Oncologia Ocular pela UNIFESP/EPM.

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