Anemia materna e anemia neonatal: uma revisão sistemática
A anemia é a deficiência nutricional mais comum entre gestantes em todo o mundo. Considerando que a anemia no período neonatal pode impactar o crescimento e desenvolvimento a longo prazo, identificar a anemia materna como um possível fator de risco relevante para os bebês nascidos dessas mulheres torna-se uma questão de saúde pública.
As evidências sobre o tema são, em geral, conflitantes. Por esse motivo, um grupo de pesquisadores conduziu uma revisão sistemática com meta-análise, buscando compreender melhor essa associação.
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Metodologia
Os autores buscaram estudos observacionais (coorte, caso-controle e transversal) relacionados ao tema em diversos bancos de dados online, incluindo PubMed, Scopus e MEDLINE.
Dois revisores avaliaram os artigos selecionados, inicialmente com base no título e no resumo, excluindo aqueles que não se enquadrassem no escopo do estudo. Em seguida, os revisores analisaram os artigos na íntegra. Um terceiro revisor foi convocado quando havia opiniões conflitantes entre os dois primeiros.
Cada estudo foi submetido a uma avaliação de risco de viés por meio da escala de Newcastle-Ottawa, sendo que estudos com valores inferiores a 5 foram considerados como de alto risco de viés.
Para variáveis binárias (anemia), foi analisada a razão de chances agrupada, com intervalo de confiança de 95% (IC 95%). Para variáveis contínuas (hemoglobina, ferro sérico e ferritina), os pesquisadores utilizaram a diferença média (DM) padronizada, considerando o mesmo intervalo.
Resultados
Após as avaliações iniciais, foram incluídos no estudo 18 artigos com um total de 1.873 pacientes, sendo a maioria considerada de baixo risco de viés. Destes, 8 eram estudos transversais, 5 eram estudos caso-controle e 5 eram estudos observacionais prospectivos.
Os autores observaram uma diferença significativa entre os grupos de gestantes com e sem anemia (DM = −1,38; IC 95%: [−1,96, −0,80]; p < 0,01), concluindo que a anemia materna tem impacto na evolução do neonato com anemia. Notou-se que filhos de mães anêmicas apresentaram níveis de hemoglobina 1,38 g/dL menores em comparação aos filhos de mulheres não anêmicas, o que sugere uma correlação.
Para investigar a sensibilidade da análise, cada estudo foi excluído individualmente, analisando-se o impacto dessas exclusões nos resultados; os pesquisadores demonstraram que essas diferenças não foram estatisticamente significativas.
Na análise de subgrupos, os resultados que indicaram uma correlação mais forte foram observados quando a coleta de sangue materno era realizada logo após o parto. Também foi constatado que, nos casos de anemia ferropriva, a relação entre anemia materna e neonatal foi mais consistente, destacando a importância de avaliar os níveis de ferro, e não apenas a hemoglobina, durante o pré-natal.
Conclusões
Os pesquisadores concluem, ponderando que o pequeno número de estudos selecionados pode aumentar o risco de viés desses achados, mas que, diante das evidências disponíveis até o momento, esses resultados sugerem a existência de uma correlação entre anemia materna e anemia neonatal. De qualquer forma, seria importante a realização de estudos investigando o impacto do tratamento das gestantes no risco de anemia neonatal.
Veja também: Caso clínico: Anemia e Gestação
Embora os resultados deste estudo não possam ser extrapolados para a rotina clínica devido às limitações apontadas pelos próprios autores, é importante ter em mente que o acompanhamento regular dos níveis de ferro das gestantes no contexto do pré-natal, e até mesmo o tratamento dessas pacientes, são condutas que já são realizadas no acompanhamento dessas gestantes.
Dessa forma, os achados servem como um alerta não apenas para os obstetras, mas também para os pediatras, no sentido de que devem idealmente investigar ativamente o status de anemia/níveis séricos de ferro durante a gestação, considerando o uso de ferro profilático nos lactentes, sempre seguindo as doses recomendadas e as respectivas apresentações de cada produto.
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