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Pediatria22 outubro 2024

EAPS 2024: Como distinguir infecções bacterianas de virais em crianças no PSI?

No EAPS 2024 foi enfatizada a importância de uma avaliação clínica cuidadosa e o uso de ferramentas diagnósticas direcionadas em infecções bacterianas pediátrica
Por Jôbert Neves

A tomada de decisão na medicina de emergência envolve o dilema crítico de “confirmar” ou “excluir” condições patológicas, o que impacta diretamente a intensidade dos exames e tratamentos oferecidos aos pacientes. Na pediatria esse racional passa pela constante necessidade de diferenciar quadros bacterianos de virais, resultando em uma conduta mais adequada e na prescrição assertiva dos antibióticos. Esses e outros pontos relacionados foram abordados no 10º Congresso da Academia Europeia de Sociedades Pediátricas (EAPS 2024) pelo Dr. Roberto Velasco, que enfatizou a importância de uma avaliação clínica cuidadosa e o uso de ferramentas diagnósticas direcionadas, especialmente em infecções bacterianas pediátricas, promovendo um cuidado que equilibra a necessidade de diagnóstico preciso e a prevenção de intervenções desnecessárias. 

Saiba mais: Como diagnosticar infecção bacteriana grave em crianças?

médico consultando criança com infecção bacteriana

Tomada de decisão na medicina de emergência: Confirmar ou excluir 

Nos departamentos de emergência, os médicos devem decidir rapidamente suas condutas. Essas decisões determinam a intensidade dos exames e tratamentos que o paciente receberá: 

  • Abordagem de confirmação: Esse método envolve a realização de muitos exames e intervenções para confirmar a presença de uma doença específica. Embora seja uma abordagem minuciosa, pode acarretar riscos, como o tratamento excessivo, internações desnecessárias e iatrogenia (danos causados pela intervenção médica). Isso pode ser caro e, em alguns casos, prejudicial, especialmente se o paciente receber tratamentos dos quais não precisa; 
  • Abordagem de exclusão: Esta é uma estratégia mais conservadora, que visa excluir condições graves sem a realização de muitos exames. É particularmente útil em sistemas de saúde pública, como o da Espanha, onde a redução de custos médicos é essencial. No entanto, o risco aqui é deixar de diagnosticar uma doença grave, o que pode ser crítico em um ambiente de emergência. 

Durante a plenária, o Dr. Velasco sugere que, em um departamento de emergência movimentado, onde os médicos não têm tempo nem recursos abundantes, a exclusão de condições, especialmente as mais graves , geralmente é mais prática.  

Foco nas infecções bacterianas 

As infecções bacterianas são uma preocupação central em emergências pediátricas. Ele as classifica em: 

  • Infecções Bacterianas Não-Invasivas: Estas incluem condições como amigdalite aguda, otite média aguda e gastroenterites agudas leves. Muitas dessas podem ser excluídas com uma boa avaliação clínica e exame físico. 

Excluindo a bacteremia: Foco na bacteremia aguda 

A bacteremia, que é a presença de bactérias na corrente sanguínea, é uma condição crítica na medicina de emergência, especialmente em casos pediátricos. O Dr. Velasco descreveu uma abordagem em quatro etapas para excluir a bacteremia: 

História Clínica e fatores de Risco: 

  • Idade: A probabilidade de bacteremia e sepse varia com a idade. Os neonatos estão em maior risco, pois são mais vulneráveis a infecções por bactérias como Streptococcus agalactiae (estreptococo do grupo B) ou Escherichia coli. Crianças mais velhas, por outro lado, têm maior probabilidade de serem afetadas por bactérias como Streptococcus pneumoniae ou Neisseria meningitidis; 
  • Estado Vacinal: Dr. Velasco falou sobre a importância da vacinação contra pneumococo na redução da incidência de bacteremia. Após receber duas doses da vacina pneumocócica, o risco de bacteremia cai para menos de 0,5%, tornando desnecessários exames extensivos em crianças com boa aparência e cobertura vacinal; 
  • Febre: Febre alta (>40,5°C) em crianças vacinadas ainda pode ser preocupante, pois aumenta a probabilidade de bacteremia para cerca de 3%. Portanto, mesmo em crianças vacinadas, se a febre for muito alta, pode ser necessário investigar mais. 

Exame Físico: 

  • Aparência é importante: O triângulo de avaliação pediátrica (TAP) é uma ferramenta amplamente utilizada para avaliar rapidamente pacientes pediátricos. Ele avalia três fatores principais: aparência, esforço respiratório e circulação na pele. Se a criança parece bem e não apresenta sinais de desconforto, a probabilidade de uma infecção bacteriana grave, como bacteremia, é menor; 
  • Sintomas respiratórios: Crianças que apresentam sintomas respiratórios claros (por exemplo, tosse, chiado) têm menos probabilidade de ter a bacteremia. Velasco observa que, em estudos da Espanha e dos Estados Unidos (EUA), crianças com febre e sintomas respiratórios tinham taxas mais baixas de bacteremia, apoiando o argumento para testes limitados nesses casos. 

Testes Rápidos (Point-of-Care Tests): 

Os testes rápidos são ferramentas diagnósticas rápidas disponíveis nos departamentos de emergência para avaliar rapidamente infecções virais comuns, como gripe, COVID-19 e vírus sincicial respiratório (VSR); 

  • Testes positivos para gripe ou COVID-19: Evidências sugerem que um teste positivo para gripe ou COVID-19 pode, de forma eficaz, excluir bacteremia, uma vez que essas infecções virais raramente estão associadas a infecções bacterianas na corrente sanguínea. 
  • Teste de VSR: Embora alguns estudos sugiram que um teste positivo para VSR reduza a probabilidade de bacteremia, as evidências são menos robustas. Velasco recomenda cautela, enfatizando a importância do julgamento clínico sobre a simples dependência dos resultados dos testes.

Leia também: Risco de infecção bacteriana invasiva em bebês com infecção febril por SARS-CoV-2 

Exames de Sangue: 

Exames de sangue, incluindo hemogramas completos (HC) e biomarcadores como proteína C-reativa (PCR) e procalcitonina (pouco utilizado no Brasil na prática clínica), podem ajudar a detectar sinais de infecção. O uso desses testes deve ser reservado para casos de alto risco ou quando a suspeita clínica permanece alta, apesar de outros fatores tranquilizadores. 

Mensagem prática: 

  • Uma abordagem conservadora e baseada em evidências para o manejo de infecções bacterianas pediátricas no departamento de emergência é recomendada;  
  • Nem toda criança febril precisa de uma bateria de exames;  
  • Devemos nos concentrar em uma história clínica detalhada, julgamento clínico e no uso de ferramentas diagnósticas direcionadas para excluir condições graves, como a bacteremia; 
  • Fornecer o cuidado necessário, evitando exames e tratamentos desnecessários, especialmente em crianças com bom perfil de baixo risco (por exemplo, crianças vacinadas com sintomas leves).
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Referências bibliográficas

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