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Endocrinologia5 abril 2025

ACP 2025: Pré-diabetes para o clínico - Qual é o manejo ideal?

Revise os critérios diagnósticos do pré-diabetes, riscos, prevenção e opções terapêuticas baseadas em estudos clínicos

O congresso do American College of Physicians (ACP 2025) está acontecendo neste momento em New Orleans, Estados Unidos, e trazemos a cobertura dos principais assuntos discutidos aqui no Portal Afya.

Em uma das sessões mais relevantes dentro da endocrinologia e da clínica médica, o Dr. Samuel Dagogo-Jack, professor e chefe da divisão de endocrinologia, diabetes e metabolismo da University of Tennessee, apresentou uma palestra abrangente e embasada sobre o manejo do pré-diabetes.

Reconhecido internacionalmente por sua contribuição à pesquisa clínica em diabetes, o Dr. Dagogo-Jack estruturou sua aula a partir de objetivos de aprendizado bem definidos: revisar os critérios diagnósticos do pré-diabetes, compreender o risco de progressão e de complicações, analisar as evidências disponíveis para prevenção e discutir as opções terapêuticas com base em dados de grandes estudos clínicos.

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Diagnóstico atual e importância de pré-diabtes

O palestrante iniciou sua apresentação destacando os parâmetros laboratoriais que definem o diagnóstico de pré-diabetes: glicemia de jejum entre 100 e 125 mg/dL, glicemia de 2 horas no teste oral de tolerância à glicose (TOTG) entre 140 e 199 mg/dL, e hemoglobina glicada (HbA1c) entre 5,7% e 6,4% (sem mencionar o “recém-adicionado” critério da IDF e da SBD, o TOTG 1h acima de 155 mg/dL).

De toda forma, o primeiro destaque sobre essa parte foi sobre a baixa concordância entre os testes, ressaltando que frequentemente um paciente pode se enquadrar apenas em um dos critérios. O estudo ADAG, publicado em 2008, mostra que um paciente com a mesma HbA1c pode apresentar glicemias de jejum variando entre 90 até cerca de 200 mg/dL, por exemplo. Além disso, existe uma disparidade étnica na análise da HbA1c, como visto em alguns estudos. Isso sem mencionar fatores classicamente conhecidos, como anemias, por exemplo. Tais divergências revelam a complexidade da fisiopatologia do pré-diabetes e a necessidade de uma abordagem diagnóstica individualizada, levando em consideração o perfil clínico e os fatores de risco do paciente. Portanto, não é válido assumir que a HbA1c seja superior à glicemia de jejum nessa avaliação ou vice-versa.

O Dr. Dagogo-Jack prosseguiu com a discussão sobre a importância clínica do pré-diabetes. Destacou que cerca de 70% dos indivíduos com esse diagnóstico evoluem para diabetes tipo 2, e que mesmo antes da conversão para diabetes franco, já se observa um risco aumentado de complicações microvasculares, como retinopatia e nefropatia, além de um risco cardiovascular elevado.

Foram apresentadas curvas que demonstram a associação entre níveis glicêmicos dentro da faixa de pré-diabetes e aumento progressivo de desfechos adversos, sugerindo que o dano metabólico se inicia precocemente.

Tratamento e prevenção do diabetes

A seguir, foi dada ênfase ao Diabetes Prevention Program (DPP), um estudo de referência com mais de 3.200 adultos com pré-diabetes. Este ensaio clínico randomizado, publicado em 2002, comparou três estratégias: intervenção intensiva no estilo de vida, metformina e placebo.

A intervenção no estilo de vida teve como metas a redução de 7% do peso corporal e a prática de pelo menos 150 minutos semanais de atividade física. Essa abordagem levou a uma redução de 58% no risco de progressão para diabetes em comparação ao placebo.

Já a Metformina mostrou uma redução de 31%, com maior eficácia observada em indivíduos com IMC ≥ 35 kg/m², idade inferior a 60 anos e mulheres com história de diabetes gestacional. A duração média de seguimento foi de 2,8 anos.

O estudo de acompanhamento DPPOS (DPP Outcomes Study) estendeu a observação por mais de 15 anos. Os participantes do grupo de estilo de vida mantiveram uma redução de 27% na incidência de diabetes, enquanto os usuários de Metformina apresentaram redução de 18%. Além disso, o DPPOS evidenciou menor incidência de complicações microvasculares nos grupos de intervenção, principalmente em relação à retinopatia e nefropatia incipientes, sugerindo que os benefícios do controle precoce da glicemia vão além da prevenção do diabetes em si.

O Dr. Dagogo-Jack também revisou o estudo chinês Da Qing, conduzido com indivíduos com intolerância à glicose, que receberam intervenções dietéticas, atividade física ou ambas. Com seguimento de até 30 anos, o estudo demonstrou uma redução de 46% na incidência de diabetes, além de benefícios significativos em mortalidade por todas as causas e desfechos cardiovasculares no longo prazo.

O Finnish Diabetes Prevention Study (FDPS), realizado na Finlândia, reforçou esses achados em outro contexto populacional, mostrando uma redução de 58% na progressão para diabetes com mudanças intensivas de estilo de vida. Esses resultados foram consistentes mesmo após uma década de seguimento.

Com base nesses dados, o palestrante reforçou que a modificação do estilo de vida permanece como a intervenção mais eficaz, segura e custo-efetiva no manejo do pré-diabetes. A perda de peso entre 5% e 10% e a prática regular de atividade física impactam não apenas o metabolismo glicêmico, mas também fatores de risco cardiovascular, como dislipidemia e hipertensão. É preciso ressaltar, ainda, o papel de padrões alimentares saudáveis, como a dieta mediterrânea, rica em fibras, gorduras monoinsaturadas e antioxidantes, que demonstraram efeito benéfico sobre a sensibilidade à insulina e controle glicêmico.

Medidas farmacológicas para o pré-diabetes

Quanto ao uso da farmacoterapia, destacou a Metformina como uma opção eficaz em populações selecionadas, como jovens com obesidade significativa ou mulheres com histórico de diabetes gestacional. Apesar de não haver aprovação universal para uso em pré-diabetes, a Metformina apresenta boa tolerabilidade, baixo custo e evidência robusta de eficácia, conforme demonstrado nos subgrupos do DPP.

O papel emergente dos agonistas do receptor de GLP-1, como a Liraglutida e Semaglutida, também ganhou menção. Embora não indicadas formalmente para tratamento do pré-diabetes, essas medicações, em estudos voltados ao tratamento da obesidade, demonstraram alto potencial de reverter o pré-diabetes.

A Semaglutida, por exemplo, levou à normoglicemia em uma proporção significativa dos pacientes com pré-diabetes ao final de 68 semanas de tratamento, sugerindo um papel promissor dessas drogas na prevenção do diabetes tipo 2.

Conclusões

Em suma, esta palestra, ainda que não trazendo grandes novidades, destacou a importância crescente de se compreender o pré-diabetes, os pitfalls frequentes em seu diagnóstico e suas consequências, seja a prevenção do surgimento do diabetes ou mesmo as inerentes à própria condição.

Testes como glicemia de jejum, HbA1c e TOTG são todos aceitáveis e devem ser repetidos anualmente em indivíduos com diagnóstico de pré-diabetes.

A mensagem final foi clara: o pré-diabetes é uma condição frequentemente subdiagnosticada, mas cujo reconhecimento e intervenção precoce podem alterar significativamente o curso natural da doença, reduzindo a incidência de diabetes tipo 2 e suas complicações crônicas. A adoção de medidas baseadas em evidências, tanto comportamentais quanto farmacológicas, deve ser a base da prática clínica nessa população.

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Referências bibliográficas

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