Baixas doses de corticoide e eventos cardiovasculares no pacientes com AR
Os glicocorticoides (GC) são medicamentos eficazes no tratamento da artrite reumatoide (AR) e, por isso, são recomendados para uso a curto prazo no tratamento desses pacientes, particularmente no início ou troca de medicamentos modificadores do curso da doença (DMARDs). Apesar dessa recomendação, estudos mostram que até 40% dos pacientes com AR se mantêm em uso de GC após o período de 3 meses.
Uma das preocupações desse uso prolongado do GC é o aumento do risco cardiovascular, especialmente porque a AR, por si só, já aumenta o risco cardiovascular dos pacientes acometidos. Por esse motivo, essa combinação pode ser bastante deletéria para os pacientes.
Para avaliar o impacto das baixas doses de corticoide no risco de eventos cardiovasculares nos pacientes com AR, Coburn et al. conduziram um estudo que analisou 2 grandes bancos de dados americanos.
Métodos
Trata-se de um estudo que analisou registros de pacientes com AR incluídos no Medicare e no Optum. Os critérios de inclusão foram pacientes ≥18 anos, com 2 códigos consecutivos de AR com intervalo ≥7 dias e que estavam recebendo DMARDs em doses estáveis por 180 dias. Apenas pacientes em uso de, pelo menos, metotrexato, biológicos ou DMARDs sintéticos alvo específicos foram incluídos (caso houvesse mudança do DMARD, o paciente poderia contribuir com mais de uma observação). Pacientes com diagnóstico de artrite psoriásica, espondiloartrite axial, doença inflamatória intestinal, lúpus eritematoso sistêmico, câncer ou HIV antes da data índice foram excluídos. A exposição ao GC foi categorizada em ≤5 (baixas doses), 5-10 e >10 mg/dia.
O desfecho primário analisado foi a incidência de um primeiro evento cardiovascular, seja infarto do miocárdio ou AVC. A censura ocorreu no dia 30/09/2015, no final do curso de DMARD estável, morte ou na mudança de categoria da dose de GC (que era recalculada a cada 90 dias), o que acontecesse primeiro.
As covariáveis foram analisadas no primeiro ano de baseline e incluíram diversos fatores de risco associados com a ocorrência de eventos cardiovasculares.
Leia também: Corticoterapia na artrite reumatoide: desmamar ou não? Resultados do estudo SEMIRA
Resultados
Foram incluídos 135.583 pacientes do Medicare e 39.272 pacientes do Optum; a taxa de eventos cardiovasculares foi de 1,3 e 0,8 por 100 pacientes-ano, respectivamente. A maioria dos pacientes estava sem o uso de GC (101.624 observações), seguida de baixas doses (57.800 observações), entre 5-10 mg/dia (23.413 observações) e >10 mg/dia (6.103 observações).
Na análise realizada com pacientes mais velhos e com comorbidades na coorte do Medicare, foi observada a associação entre GC e eventos cardiovasculares, de maneira dose dependente: a incidência nos modelos ajustados foi de 1,1% (IC95% 1,1-1,2%) nos pacientes sem GC, 1,4% (IC95% 1,2-1,6%) nos pacientes com ≤5 mg/dia, 1,6% (IC95% 1,4-1,9%) nos pacientes entre 5-10 mg/dia e 1,8% (IC95% 1,2-2,5%) nos pacientes com >10 mg/dia.
A mesma associação não foi descrita na coorte Optum. No entanto, nos pacientes jovens com alto risco cardiovascular, os GC se associaram com aumento do risco cardiovascular também de maneira dose dependente.
Comentários
Esse estudo é importante por demonstrar que o uso de prednisona, mesmo em baixas doses, pode se associar com um risco aumentado de eventos cardiovasculares no pacientes com AR, principalmente naqueles mais velhos com comorbidades e nos jovens com alto risco cardiovascular.
Dessa forma, apesar de útil para o controle sintomático da sinovite, o uso dos GC deve ser feito pelo menor tempo possível, objetivando a sua suspensão assim que possível. Caso o paciente apresente reativação do quadro inflamatório com a suspensão, está indicada a troca do DMARD até que a suspensão (ou, pelo menos, o uso da menor dose necessária) seja possível.
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