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Terapia Intensiva30 outubro 2024

Abordagem para a Reversão de Anticoagulantes 

Nesta revisão, resumimos os agentes utilizados para reversão de anticoagulantes, suas indicações e seus efeitos e mecanismos de ação

Os anticoagulantes orais diretos (DOACs) revolucionaram o tratamento das doenças tromboembólicas, como a fibrilação atrial e o tromboembolismo venoso, por oferecerem vantagens em relação aneuploidias aos antagonistas da vitamina K, como menor necessidade de monitoramento e menor risco de hemorragia intracraniana. Contudo, o risco de hemorragia grave, embora atenuado, ainda persiste, de forma que o manejo de sangramentos na vigência de DOACs é um desafio clínico.  

Nos últimos anos, surgiram agentes específicos para a reversão de DOACs, como ilustrados abaixo, além de alternativas não específicas, como os concentrados de complexo protrombínico (PCCs).   

DOACs Inibidores do fator Xa Inibidor da trombina 
Exemplos Apixabana, Rivaroxabana e Edoxabana Dabigatrana 
Testes funcionais Atividade do fator anti-Xa Tempo de trombina diluída 
Antídoto Andexanet alfa Idarucizumabe (5g EV em 30 min) 

Quando a reversão de anticoagulantes é necessária? 

A reversão imediata dos DOACs, para controlar sangramentos ou mitigar o risco de ocorrência de complicações, pode ser indicada em três situações principais:  

  • Hemorragias com risco de vida, como hemorragia intracraniana (HIC); 
  • Hemorragia em órgãos críticos ou cavidades; 
  • Necessidade de cirurgia ou intervenção urgente, especialmente em procedimentos de alto risco de sangramento, como as neurocirurgias. 

Abordagem para a Reversão de Anticoagulantes 

Avaliação inicial 

A primeira etapa no manejo de sangramento ou indicações cirúrgicas inesperadas na vigência de DOACs é avaliar a gravidade da hemorragia ou emergência da intervenção cirúrgica, o tempo desde a última dose do anticoagulante e a função renal, que afeta a depuração do medicamento.  

Se disponíveis, os testes laboratoriais para medir os níveis de anticoagulantes são úteis. 

Agentes Específicos de Reversão 

Idarucizumabe

Trata-se de anticorpo monoclonal aprovado para a reversão rápida da dabigatrana, ligando-se à molécula com alta afinidade e neutralizando seus efeitos em minutos.  

O estudo RE-VERSE AD mostrou que o idarucizumabe reverteu os efeitos anticoagulantes da dabigatrana em 88 a 98% dos pacientes em até 24 horas, com normalização da hemostasia em 92% dos pacientes submetidos a cirurgias emergenciais, com efeito sustentado por 24 horas. O risco de complicações tromboembólicas após reversão foi baixo (4,8%), principalmente em pacientes que não retomaram a anticoagulação. 

Andexanet Alfa

Trata-se de um agente de reversão dos inibidores do fator Xa que, ao atuar como um “fator Xa falso”, inativa os seus efeitos e restaura a geração de trombina. É recomendado exclusivamente para usuários de apixabana ou rivaroxabana.  

A administração envolve um bolus inicial seguido de infusão contínua por 2 horas, com a dose ajustada com base no tipo e tempo de administração do DOAC. 

O estudo ANNEXA-4 avaliou o uso de andexanet alfa em pacientes com hemorragia maior, demonstrando uma redução de 93% nos níveis de anti-FXa e resposta hemostática satisfatória em 80% dos pacientes, às custas de uma taxa significativa de eventos tromboembólicos (10%). 

Leia também: Como fazer reversão de anticoagulação?

Agentes Não Específicos de Reversão 

Concentrados de Complexo Protrombínico (PCCs) 

Os PCCs, especialmente os de quatro fatores (4F-PCC – FII, FVII, FIX e FX), são amplamente utilizados como uma alternativa para a reversão de DOACs.  

Os estudos sugerem eficácia hemostática na reversão de hemorragias causadas por inibidores do fator Xa em torno de 70 a 80%. O risco de eventos tromboembólicos com PCCs é baixo, mas ampliado em doses elevadas ou repetidas. 

Outros Agentes de Reversão 

Outros agentes, como o complexo protrombínico ativado (aPCC) e o fator VIIa recombinante (rFVIIa), têm sido usados em situações emergenciais de sangramento, com resultados mistos.  

Comparação de Estratégias de Reversão 

Há escassez de estudos comparativos entre os agentes específicos e não específicos de reversão dos DOACs. Entretanto, algumas evidências sugerem que os PCCs podem ter eficácia semelhante ao andexanet alfa em termos de controle de sangramento, com menor risco de complicações tromboembólicas. A escolha entre esses agentes deve considerar a disponibilidade, o custo e o perfil de segurança. 

Estratégias Emergentes de Reversão 

Ciraparantag

O ciraparantag é um agente reversor em desenvolvimento que tem o potencial de reverter o efeito de vários anticoagulantes, incluindo DOACs. Estudos iniciais indicam que pode ser eficaz na normalização do tempo de coagulação em pacientes tratados com apixabana e rivaroxabana. 

Variantes de FXa

Outra abordagem em estudo envolve variantes modificadas do fator Xa, que mantêm a atividade pró-coagulante e são resistentes aos DOACs. Estudos clínicos com essas variantes estão em andamento. 

Abordagem de Reversão em Cirurgias de Urgência 

A indicação de cirurgias de urgência e emergência entre usuários de DOACs é um desafio clínico significativo.  

O manejo requer um equilíbrio cuidadoso entre a prevenção de sangramentos excessivos, manutenção de uma coagulação adequada e minimização do risco de eventos tromboembólicos subsequentes. 

A estratégia de reversão do efeito do DOAC depende da urgência do procedimento e da concentração sérica de anticoagulante. As opções incluem agentes específicos e não específicos. 

Certas cirurgias, como neurocirurgias, cirurgias espinhais ou procedimentos vasculares de grande porte, exigem hemostasia perfeita, tornando imperativa a reversão completa dos anticoagulantes. Já em procedimentos de menor risco, como cirurgias abdominais eletivas, pode ser aceitável realizar o procedimento com anticoagulação parcial, desde que haja um planejamento cuidadoso e disponibilidade de agentes hemostáticos, como tranexâmico. 

Nas cirurgias emergenciais, a serem realizadas em menos de 6 horas, e que não podem ser adiadas (por exemplo, intervenções para hemorragias intracranianas, trauma abdominal grave, ou rupturas de aneurisma), a reversão imediata dos efeitos dos DOACs é essencial para evitar complicações hemorrágicas graves.  

As cirurgias urgentes, a serem realizadas entre 6 e 24 horas, permitem um intervalo maior para preparação, havendo a possibilidade de aguardar a eliminação parcial do anticoagulante, especialmente se o tempo desde a última dose do DOAC for conhecido e a função renal do paciente for normal. 

A monitorização frequente dos níveis de DOACs pode ser benéfica, permitindo que a cirurgia seja realizada quando os níveis de anticoagulantes estiverem suficientemente baixos (geralmente <50 ng/mL). Em casos em que não seja possível esperar, a reversão com os agentes medicamentosos deve ser realizada. 

Já nas cirurgias semiurgentes, a serem realizadas entre 24 e 48 horas, como fraturas de quadril ou colecistectomias em pacientes estáveis, a eliminação passiva do DOAC pode ser considerada. Se a função renal for adequada, a anticoagulação residual pode ser naturalmente eliminada após 24 a 48 horas, evitando a necessidade de agentes de reversão. A cirurgia pode ser programada de forma a coincidir com a depuração natural dos anticoagulantes, ou, se os níveis de DOACs permanecerem elevados, pode ser utilizada a reversão pré-operatória. 

Retomada da Anticoagulação no Pós-operatório 

Um aspecto crucial do manejo perioperatório é a retomada da anticoagulação após o procedimento cirúrgico, uma vez que a interrupção prolongada aumenta o risco de eventos tromboembólicos, como trombose venosa profunda ou embolia pulmonar. 

A anticoagulação deve ser retomada o mais rápido possível, idealmente dentro de 24 a 72 horas, dependendo da extensão do sangramento, estabilidade do paciente e tipo de cirurgia realizada. 

Em pacientes de alto risco, pode ser considerada a tromboprofilaxia com anticoagulantes de ação curta (como heparina de baixo peso molecular) até que seja seguro reiniciar o DOAC. 

Mensagens para Levar para Casa 

  • Os agentes específicos de reversão dos DOACs (idarucizumabe e andexanet alfa) são altamente eficazes em sangramentos, mas devem ser utilizados com cautela devido ao custo elevado e risco de eventos tromboembólicos. 
  • Os concentrados de complexo protrombínico (PCCs) oferecem uma alternativa viável para reversão de inibidores do fator Xa, especialmente na indisponibilidade dos agentes específicos. 
  • Sempre que possível, os níveis de anticoagulantes devem guiar as decisões clínicas. 
  • Novas abordagens, como o ciraparantag e variantes de FXa, podem ampliar as opções terapêuticas para a reversão de anticoagulantes.
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Referências bibliográficas

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