Estudos recentes nos últimos 5 anos mostraram potencial benefício do uso de corticoide para pneumonia comunitária grave (PAC). Este tratamento ganhou impulso com a pandemia de covid-19, na qual o tratamento com dexametasona, e depois outras fórmulas de corticoide, reduziram a mortalidade em pacientes com pneumonia por SARS-CoV-2 e hipoxemia. Isto despertou novamente a curiosidade para testar seu uso em pneumonia comunitária grave (sendo que grave é potencialmente a pneumonia que precisa ser tratada com internação hospitalar; se houver disfunção orgânica, pode se chamar de sepse; e se houver choque, é classificada como choque séptico).
- Já sabemos que os corticoides reduzem o tempo de uso de vasopressores no choque séptico, porém os resultados em pacientes com sepse sem choque não foram animadores antes do ano 2020. O estudo clínico de Dequin e colaboradores em 2023 mostrou benefício com redução de 40% na mortalidade relativa em 28 dias. Desde então, o uso de corticoide para pacientes com PAC (seja viral ou bacteriana), que internam e precisam de suporte respiratório ou cardiovascular (exceto choque), voltou a ser considerado “standard” no tratamento.
Objetivos e Metodologia
- Este estudo é parte do REMAP-CAP, que foi realizado desde 2018 e incluiu a pandemia de covid-19. Ele também confirmou o benefício do corticoide para a covid-19.
- O principal objetivo era mortalidade em 90 dias. Outros objetivos foram tempo de permanência e mortalidade na UTI, dias de suporte orgânico e progressão para ventilação mecânica invasiva. Foram incluídos pacientes com uso de corticoide e pneumonia comunitária (seja viral ou bacteriana), que internam e precisam de suporte respiratório ou cardiovascular. Excluiu-se choque séptico ou cuidados paliativos.
- Foi usada hidrocortisona nas doses de 50 mg a cada 6 horas e por no máximo 7 dias.
Resultados: Corticoide para pneumonia comunitária
- Foram 22.568 pacientes avaliados entre 2018 e 2023, e cerca de metade foi captado para algum domínio do estudo REMAP-CAP. Os grupos foram compostos por pacientes sem corticoide (n=125), com dose fixa de hidrocortisona (n=553) e outro corticoide (n=267). Para os fins de estudo, apenas os dois primeiros grupos foram avaliados. Os autores ainda analisaram outros domínios do grande estudo REMAP e separaram pacientes que usaram hidrocortisona e tinham PAC e outros controles que não usaram corticoide. Esta análise serviu como comparação ao estudo principal, para corroborar resultados e compensar o menor tamanho amostral provocado pela interrupção precoce do estudo em 2023.
- Em relação às características dos pacientes, 4% tinha influenza em todos os grupos, pacientes que receberam corticoide tinham idade maior (62 versus 58 anos), cerca de 40% usou ventilação mecânica invasiva, 31-38% usaram cateter de alto fluxo de oxigênio e 7-10% usando apenas oxigenoterapia. Cerca de 37-41% dos pacientes tiveram alguma bactéria isolada em culturas e 4-6% dos pacientes tiveram coinfecções vírus com bactérias.
- A diferença de mortalidade não foi significativa: 15% para hidrocortisona e 9,8% para controle. A razão de chances foi de 1,56 (intervalo de confiança 95% de 0,80–3,31); houve 10% de probabilidade de superioridade para corticoide, 3.4% de probabilidade de igualdade e 90% de probabilidade de malefício. Esta análise diferente projeta resultados se a amostra fosse maior e houve constância de desfechos entre os grupos. Portanto, não há diferença significativa de desfechos, mas há chance maior de malefício do que benefício para o uso de corticoide na PAC. O único benefício significativo do uso de corticoide é a retirada de suporte hemodinâmico com vasopressores. O tempo de permanência foi de 5 dias (mediana) em todos os grupos; cerca de 70-75% dos pacientes tiveram alta para casa.
Mensagens para o dia a dia:
- O uso regular de hidrocortisona para pneumonia comunitária grave continua sendo considerado duvidoso;
- A maior chance é que o corticoide não melhore os principais desfechos como tempo de permanência ou mortalidade, mas há risco de malefício, que deve ser confirmado em estudos maiores no futuro.
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