A sepse é uma patologia frequente em pacientes hospitalizados. O uso de biomarcadores, como a procalcitonina, tem sido estudado para guiar a descontinuação precoce de antibióticos, reduzindo a resistência bacteriana e os efeitos adversos associados ao uso prolongado.
Contexto
A resistência aos antibióticos está aumentando, sendo prevista como a principal causa de morte no mundo até 2050 — contabilizando 10 milhões de mortes por ano. Pacientes graves em UTI estão em alto risco de infecção por organismos multirresistentes (MDR) devido à deficiência imunológica adquirida, resultando em uma morbidade e mortalidade muito elevadas.
O uso inadequado de antibióticos em UTI aumenta o risco de resistência bacteriana e complicações associadas. A estratégia para a abordagem inicial da sepse é a administração urgente de antibióticos, porém cerca de 60% dos pacientes com este diagnóstico inicial têm a infecção confirmada. Isso pode resultar em uma terapia com antibióticos desnecessária, aumentando assim as chances de danos e os custos associados ao tratamento com antibióticos.
A procalcitonina (PCT), um biomarcador inflamatório, tem sido amplamente estudada como ferramenta para diferenciar infecções bacterianas de outras etiologias. Guiar a terapia antibiótica com PCT pode reduzir o uso desnecessário de antibiótico, diminuindo efeitos adversos e custos.
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Resultados mais recentes
Algumas metanálises têm sido feitas a fim de definir qual o impacto do uso da procalcitonina em diferentes populações, considerando como desfechos estudados o tempo de uso de antibióticos, recorrência de infecção ou infecção secundária, tempo de internação e mortalidade. Na maioria deles, a terapia guiada pela PCT está associada a uma menor duração da antibioticoterapia e a uma redução na mortalidade, mas com resultados conflitantes nos desfechos secundários como recorrência e taxa de infecção secundária.
Nos estudos que avaliaram apenas pacientes com infecções respiratórias, a análise mostrou que o grupo guiado por PCT teve uma redução na mortalidade, menor uso de antibióticos e a taxa de efeitos adversos relacionados a antibióticos também foi menor. Não houve diferença significativa na taxa de falha de tratamento ou no tempo de internação hospitalar e em UTI entre os grupos. Os resultados foram consistentes em diferentes apresentações clínicas e tipos de infecção respiratória.
Já estudos que utilizaram diferentes tipos, causas e classificações de sepse encontraram redução do tempo de uso de antibióticos mas maiores taxas de recorrência de infecção, sem resultados consistentes em relação à taxa de infecção secundária, demostrando que avaliações adicionais devem ser realizadas. A terapia guiada por PCT pode reduzir significativamente o uso de antibióticos e a mortalidade a curto prazo em pacientes críticos, especialmente aqueles com sepse definida pelos critérios Sepsis-3. Contudo, a maior taxa de infecção recorrente levanta preocupações sobre a adequação das interrupções precoces.
Já na população oncológica, o uso da PCT para guiar a interrupção de antibióticos não reduziu a duração do tratamento em pacientes oncológicos críticos com sepse. Esse resultado sugere que a PCT, isoladamente, pode não ser um indicador confiável para o manejo antibiótico em pacientes com câncer, devido às particularidades dessa população, como inflamação associada ao próprio câncer.
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Conclusão e aplicabilidade
Na prática clínica, a implementação de protocolos de PCT pode ser útil para otimizar o uso de antibióticos, particularmente em instituições onde tratamentos prolongados são comuns. Os estudos reforçam a necessidade de protocolos mais uniformes e pesquisas que avaliem a cinética da PCT (ou seja, mudanças em 12–24 horas) em comparação com protocolos baseados em um valor fixo (como 0,5 ng/mL como limite). São necessários, ainda, novos estudos que avaliem o impacto em populações específicas, como pacientes imunocomprometidos e aqueles submetidos a intervenções cirúrgicas.
Para pacientes críticos, a PCT pode ser uma ferramenta útil na redução da exposição a antibióticos, mas seu uso deve ser balanceado com o risco potencial de recorrência de infecções. A implementação da PCT como parte da rotina em UTI exige mais estudos para definir melhor seus benefícios e suas limitações, especialmente entre subgrupos específicos de pacientes, como os oncológicos ou aqueles com diferentes classificações de sepse. Na prática clínica, esses estudos indicam que o monitoramento da PCT pode auxiliar na decisão de descontinuar antibióticos, promovendo um uso mais racional e seguro, especialmente em ambientes com alta taxa de prescrição de antibióticos, mas não substitui o julgamento clínico na decisão de cessação de antibióticos.
Mensagem final
A terapia antibiótica guiada por PCT é uma estratégia promissora para a redução do uso de antibióticos e mortalidade em pacientes críticos, embora precise de maior padronização e estudos adicionais para avaliar sua aplicabilidade em subgrupos específicos. É uma ferramenta viável para o manejo em UTIs, contribuindo para a luta contra a resistência antimicrobiana.
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