Logotipo Afya
Anúncio
Terapia Intensiva29 outubro 2024

Guidelines sobre cuidados de fim de vida e cuidado paliativo na UTI 

A Sociedade Europeia de Cuidados Intensivos (ESICM) publicou recomendações sobre cuidados paliativos e de fim de vida
Por André Japiassú

Uma boa parte das mortes nas UTIs ocorre após decisões sobre limitação de tratamentos e suportes de vida a pacientes com estado grave de adoecimento e falta de benefício destas terapêuticas. O momento de tomada de decisão de virada de tratamento curativo para cuidados de fim de vida é muito variável e difícil de prever na maioria dos casos; as decisões envolvem não início ou progressão de terapias ou mesmo suspensão destas. Vários fatores podem influenciar este turnpoint, incluindo aspectos clínicos da doença aguda, de comorbidades avançadas, culturais, religiosos, sociais e até econômicos. Além da tomada de decisões, outros pontos como surgimento de conflitos, falhas de comunicação, bem-estar da família e dos profissionais de Saúde também devem ser considerados na ampla discussão sobre Cuidados Paliativos. 

Leia também: Cuidados paliativos na atenção primária à saúde

Neste guideline, os autores reuniram 19 experts em cuidados paliativos, participantes da Sociedade Europeia de Cuidados Intensivos, separando sete domínios para definir perguntas e procura de evidências de literatura para as respostas. Houve classificação das evidências, sendo recomendações fortes se houvesse estudo clínico controlado ou fracas com estudos observacionais e sugestões se não se achasse estudos relacionados ao domínio e ficasse com a opinião de experts.

Veja abaixo a tabela com resumo das recomendações para cuidados de fim de vida:  

Domínio

Recomendação/Sugestão

Nível de evidência 

Diversidade sobre cuidados de fim de vida em diferentes países 

Regulações nacionais sobre limite de suporte à vida (limitação ou retirada) podem ajudar cuidados de fim de vida; países sem regulamentações podem sofrer com heterogeneidade de condutas; experts opinam que países mais ricos têm melhores condições de ambientes para Cuidados Paliativos. 

Sem nível de evidência (um estudo multicêntrico com questionário) 

Tomada de decisão: intervenções com instrumentos de preferências e objetivos do cuidado melhoram desfechos de cuidados de fim de vida; estratégias estruturadas de seleção de pacientes para limitações de suportes podem melhorar desfechos; estes instrumentos podem reduzir desconforto e burnout na equipe multidisciplinar que lida com pacientes com indicação de cuidados paliativos 

Os membros da família devem ter entendimento suficiente da situação do paciente para situar os objetivos de cuidados; instrumentos adjuvantes de tomada de decisão podem auxiliar; comunicação e suporte estruturado podem ser oferecidos para o familiar ou responsável pelo paciente para reduzir luto, ansiedade e desordem de estresse pós-traumático*; estes instrumentos estruturados podem auxiliar na redução de insatisfação da equipe multidisciplinar diante do paciente com pior prognóstico e indicação de limite de suporte. 

*Nível fraco de evidência (estudos observacionais); restante sem nível de evidência, se baseiam em opiniões de experts. 

Cuidados paliativos: consulta com especialistas em paliativos, com instrumentos estruturados e protocolos com avaliação de terapias envolvendo condições, prognóstico e objetivos avançados de vida 

Instrumentos validados de avaliação de sintomas (ex. dor) podem aliviar sofrimento e incrementar o tratamento paliativo*; consulta com especialista de pacientes com alto risco de morbimortalidade, conferência familiar com suporte protocolar, e revisões regulares da necessidade de proporcionalidade de intervenções em pacientes candidatos a fim de vida devem ser realizados entre equipe multidisciplinar e membros da família, reduzindo procedimentos desnecessários e tempo de permanência em UTI. 

*Nível fraco de evidência (estudos observacionais); restante sem nível de evidência, se baseiam em opiniões de experts. 

Comunicação: programa de educação da equipe da UTI*; material auxiliar (vídeos, website, brochuras) #; intensivistas treinados em cuidados paliativos *; abordagem estruturada de encontros entre família e equipe da UTI* 

Materiais acessórios para melhorar a comunicação entre time multidisciplinar e familiares melhoram desfechos e incrementam a comunicação oral já existente entre as partes; treinamentos sobre cuidados de fim de vida da equipe de Saúde e estruturação dos encontros com família têm menor nível de evidência mas parecem melhorar desfechos também em Cuidados de fim de vida 

# Nível alto de evidência; *Nível fraco de evidência (estudos observacionais) 

Cuidado centrado na Família: esquemas de visita; presença no momento de parada cardíaca; follow-up de luto; formas de comunicação remotas; avaliação cultural do processo de morte 

# Material impresso de informações sobre luto combinado com conferência familiar antes da morte ajudam durante o processo de fim de vida; 

*Sugere-se não enviar condolências por cartas após morte para família; 

Esquemas de visita flexíveis ou abertas melhoram satisfação da família mas não alteram outros desfechos como luto e desordem de estresse pós-traumático; 

Familiares presentes durante reanimação cardíaca ou comunicação remota não alteraram desfechos no fim de vida. 

# Nível alto de evidência; *Nível fraco de evidência (estudos observacionais); restante sem nível de evidência, se baseiam em opiniões de experts. 

Colaboração interprofissional 

 

Tomadas de decisão em cuidados de fim de vida entre profissionais de diferentes habilidades não alteram desfechos. 

Sem recomendação.

Conflitos e burnout: Estratégias de prevenção e manuseio de conflitos; prevenção organizacional e estratégias pessoais (ex. parecer de profissionais de Bioética) 

Não há evidências de qualidade para combate de surgimento de conflitos ou redução de burnout entre profissionais ou familiares durante cuidados de fim de vida; experts sugerem incremento na comunicação multidisciplinar (enfermeiros são mais suscetíveis a estas complicações) sobre cuidados e objetivos de fim de vida, incluindo intervenções desnecessárias em cada caso. 

Sem recomendação. 

Parece existir uma relação entre menor número de terapias de suporte à vida e respeito à autonomia do paciente e da família, e há maior satisfação das partes durante o processo de fim de vida. Também é importante levar em consideração que aspectos culturais e religiosos devem ser abordados e ajustados durante o cuidado dos pacientes. 

Uma estratégia muito usada é o time-limited trial, ou seja, tentativa de tratamento limitado: todas as intervenções comuns e suportes são realizadas por curto período (geralmente 2-4 dias) e a resposta ao tratamento é observado, com ciência e concordância dos familiares. Comunicação frequente e objetivos claros de tratamento e alvos de melhoria do quadro são realizados e a tomada de decisão é acelerada, com limitação do suporte (não aumentar terapias — withholding — ou retirada parcial ou total destes suportes — withdrawal). Oito estudos observacionais mostraram encurtamento de permanência em UTIs, menor duração e intensidade de tratamento e aumento da qualidade de reuniões com famílias. Mas os experts avaliaram que o nível de evidência foi insuficiente para fazer recomendações sobre este tema. 

Veja mais: O que são e como realizar Diretivas Antecipadas de Vontade (DAVs) [vídeo]

Concluindo, a maior parte de recomendações são de menor peso científico, por conta da escassez de estudos mais estruturados no campo da Medicina Intensiva e Cuidados Paliativos. As melhores evidências se relacionam com material auxiliar para comunicação da equipe da UTI com familiares (textos, brochuras, panfletos) para incrementar a comunicação oral e também material adicional para conferência familiar sobre cuidados de fim de vida para acompanhar o luto.

Anúncio

Assine nossa newsletter

Aproveite o benefício de manter-se atualizado sem esforço.

Ao assinar a newsletter, você está de acordo com a Política de Privacidade.

Como você avalia este conteúdo?

Sua opinião ajudará outros médicos a encontrar conteúdos mais relevantes.

Referências bibliográficas

Compartilhar artigo