As estatinas permanecem como a base do tratamento da hipercolesterolemia, porém uma parcela dos pacientes apresenta intolerância a essa classe. Tal condição é definida pela ocorrência de sintomas musculares recorrentes (como mialgia, miosite ou fraqueza muscular), com ou sem elevação de CK, que desaparecem após a suspensão e retornam com a reintrodução. Ocorrem com, pelo menos, dois agentes, sendo um deles na menor dose (intolerância completa) ou impossibilitando o uso de dose suficiente para o alcance de metas lipídicas (intolerância parcial).
Estudos apontam que até 10% dos pacientes em prática clínica apresentam algum grau de intolerância, sendo os eventos adversos musculares o principal motivo para a descontinuação.
Alternativa farmacológica
O ácido bempedoico surge como uma opção oral para esses pacientes. Trata-se de um pró-fármaco ativado pela acil-CoA de cadeia muito longa tipo 1 (ACSVL1), enzima expressa no fígado, mas não no tecido muscular o que explica sua baixa associação com eventos adversos musculares. Quando ativada, atua inibindo a ATP Citrato Liase, enzima envolvida na síntese intracelular de colesterol, levando a maior expressão dos receptores de LDL-c. Em monoterapia, promove uma redução média do LDL-C em torno de 17% a 25%.
Como sua potência é relativamente baixa, a associação com ezetimiba é recomendada, potencializando a queda de LDL-C para até 35% a 40%. No estudo CLEAR, em pacientes de alto risco cardiovascular com intolerância às estatinas, o ácido bempedoico levou a redução do risco de eventos cardiovasculares.
Orientação prática
Tanto o ácido bempedoico quanto a ezetimida devem ser administradas uma vez ao dia, com ou sem alimentos, e é importante orientar a tomada em horário regular, de preferência no mesmo período do dia, para otimizar a adesão. Mas pode ser em qualquer horário, devido ao perfil de ação mais prolongada (meia vida de 21h).
Interações medicamentosas
- Não apresenta interação significativa com a maioria dos anti-hipertensivos, antidiabéticos ou anticoagulantes de uso comum.
- Deve-se ter atenção em pacientes em uso concomitante de estatinas em altas doses (particularmente sinvastatina >20 mg ou pravastatina >40 mg pela maior metabolização hepática), pois pode haver risco aumentado de eventos musculares e elevação de transaminases.
Efeitos adversos
- Em geral, bem tolerado.
- Podem ocorrer: elevação de ácido úrico (com risco aumentado de gota em predispostos), discreta elevação de transaminases e sintomas gastrointestinais leves.
- Os eventos musculares são incomuns, uma grande vantagem frente às estatinas.
Resumo prático
O ácido bempedoico associado à ezetimiba representa uma estratégia útil para pacientes com hipercolesterolemia que não conseguem utilizar estatinas em doses eficazes devido à intolerância. Embora a potência isolada seja limitada, a associação garante reduções relevantes de LDL-C, com perfil de segurança favorável e baixa incidência de sintomas musculares, além de benefício comprovado na redução de desfechos cardiovasculares nesse grupo de pacientes com intolerância.
Autoria

Luciano de França Albuquerque
Graduação em medicina pela Universidade Federal do Vale do São Francisco • Residência em Clínica Médica pelo Hospital Regional de Juazeiro – BA • Residência em Endocrinologia e Metabologia pelo Hospital das Clínicas da UFPE • Título de Especialista pela Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia • Médico Endocrinologista no Hospital Esperança Recife e Hospital Eduardo Campos da Pessoa Idosa
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