O hiperaldosteronismo primário (HAP) vem sendo reconhecido como a forma mais comum e modificável de hipertensão secundária. O HAP é caracterizado pela produção de aldosterona independente de renina, decorrente principalmente de hiperplasia ou adenoma das glândulas suprarrenais, resultando em ativação inadequada do receptor mineralocorticoide (MR). O diagnóstico precoce e a implementação do tratamento direcionado à aldosterona são essenciais, pois o HAP leva a um risco desproporcionalmente maior de desfechos cardiovasculares adversos em comparação com a hipertensão essencial, independentemente da pressão arterial (PA).
Historicamente, o rastreio do HAP tem sido restrito a populações sabidamente de alto risco, incluindo hipertensão resistente, hipertensão com hipocalemia, e hipertensão com nódulo adrenal. No entanto, diversas sociedades estão expandindo suas recomendações para rastreio de todos os adultos com hipertensão. Recentemente, a Endocrine Society adotou essa recomendação, que deve passar a ser seguida universalmente. Em todas essas recomendações, entretanto, a avaliação diagnóstica passa por valores de aldosterona elevados (pelo menos > 10ng/ml). Diante de valores abaixo desse limiar, mas com níveis suprimidos de renina, estaria indicado o diagnostico de HAP subclínico.
O HAP subclínico está associado a risco aumentado para a ocorrência de desfechos cardiovasculares graves, mesmo em pessoas com pressão arterial (PA) normal. Tais riscos chegam a ser comparáveis aos observados nos casos de HAP clássico, de acordo com recente publicação na revista Circulation.
Métodos
O estudo prospectivo analisou dados de 2017 adultos canadenses da coorte CARTaGENE nos quais foram dosados aldosterona e renina no inicio do acompanhamento (2009–2010). O objetivo foi avaliar a associação entre as dosagens séricas e sua relação com a ocorrência de eventos cardiovasculares adversos maiores (MACEs), que foram definidos como uma combinação de infarto do miocárdio, acidente vascular cerebral isquêmico ou hemorrágico, hospitalização por insuficiência cardíaca e morte cardiovascular.
Resultados
A média de idade da população estudada foi de 56 anos, e a maioria dos pacientes (92%) era branca. Cerca de metade (55%) tinha PA superior a 130/80 mm Hg, e poucos participantes tinham diabetes (7%) ou histórico de doença cardiovascular (3%). A PA média foi de 129/76 mmHg, com hipertensão presente em 27%. Durante um acompanhamento médio de 10,8 anos, ocorreram 57 (3%) eventos. Menor concentração de renina (aHR, 2,22 [IC 95%, 1,02-4,76]) e maior proporção de aldosterona/renina (aHR, 2,43 [IC 95%, 1,15-5,12]) foram associadas a um maior risco de MACE, enquanto nenhuma associação significativa foi encontrada com a concentração de aldosterona (aHR, 1,57 [IC 95%, 0,42-5,90]). A concentração de renina exibiu uma relação não linear com o risco de MACE, com limiares ideais para discriminar um risco mais alto de MACE sendo concentração de renina ≤4,0 ng/L (aHR, 2,12 [IC 95%, 1,21–3,72]) e a relação aldosterona/renina ≥ 19 ng/dl por ng/L (aHR, 2,03 [IC 95%, 1,09–3,80]). Todas as associações acima mencionadas foram independentes da pressão arterial.
Conclusão e mensagem prática
No momento em que o rastreio universal do hiperaldosteronismo vem sendo adotado, o estudo traz perspectivas importantes. Entre uma população adulta presumivelmente “saudável”, na qual os indivíduos tinham poucas comorbidades sendo a maioria com pressão arterial normal ou hipertensão leve, a presença de HAP subclínico foi associada a um maior risco de eventos cardiovasculares adversos maiores independentes da pressão arterial. Estudos futuros devem examinar se a identificação precoce de HAP subclínico (no momento do diagnóstico inicial de hipertensão ou mesmo pré-hipertensão) e o início da terapia direcionada à aldosterona podem reduzir o risco cardiovascular associado a essa condição.
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