Esquecimento no idoso: isso é normal?
Esquecimento: será que isto é “normal da idade”? Muitos no meio médico têm esse questionamento a respeito de idosos que iniciam quadro de esquecimento.
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Esquecimento: será que isto é “normal da idade”? Muitos no meio médico têm esse questionamento a respeito de idosos que iniciam quadro de esquecimento e perda de algumas habilidades. A questão é que, na verdade, a maioria dos idosos não apresenta déficits de memória.
Caso haja deficiência em evocar novos materiais aprendidos, estes indivíduos saem da curva de “envelhecimento normal”. O que ocorre é uma redução do tempo de percepção da informação, verificada pelo digit span test, mas quando é permitido um tempo maior para que ele a processe, a memória no idoso com envelhecimento normal mostra-se ser a mesma de uma pessoa jovem. (Knopman, 2003)
O que comumente ocorre em idosos que apresentam redução da memória é o fato de que ele possa ser portador de doenças neurológicas insipientes. Normalmente este idoso percebe o déficit que vem se apresentando e chega ao consultório com esta queixa, preocupado com o futuro.
Em outros casos, este déficit não é auto-percebido e vem a ser a queixa dos familiares na consulta. É importante, então, atentar para casos em que um quadro demencial esteja se insinuando, quando o paciente começar a perder a capacidade de autogerenciamento, como esquecer ou confundir medicamentos, perder-se em locais conhecidos, não for mais capaz de gerenciar seu próprio dinheiro, tornar-se cada vez mais isolado socialmente.
Por outro lado, é importante saber o que caracteriza Demência para se entender melhor o que é o normal, bem como para identificá-la mais precocemente, ainda na fase de Declínio Cognitivo Leve.
DEMÊNCIA
Demência é uma síndrome caracterizada pela perda de funcionalidade, podendo ser de diversos domínios, entre eles, a memória, assomada ao comprometimento das atividades de vida diária. De acordo com o DSM-5 atualizado em 2013, os critérios para Demência (agora denominada Transtorno Cognitivo Maior) são:
● Evidência na história e avaliação clínica que indique declínio cognitivo significativo em, pelo menos, um dos domínios:
- Aprendizado e Memória
- Linguagem
- Função executiva
- Atenção complexa
- Função perceptual-motora
- Cognição social
● A disfunção deve ser adquirida e COMPARADA ao domínio cognitivo prévio do indivíduo.
● Os déficits cognitivos devem interferir na independência em suas atividades de vida diária.
● O quadro deve ser insidioso em caso de demências neurodegenerativas (como a Doença de Alzheimer), baseado em evidências da história ou testes de estado mental seriados.
● Não se pode considerar distúrbios que estejam associados ao curso de um delirium.
● Os distúrbios não são melhores explicados por outro transtorno mental, como Depressão Maior ou Esquizofrenia.
O que mudou no DSM-5 é justamente a menor enfatização dos transtornos de memória, e expandiu os declínios cognitivos a serem avaliados como cognição social e atenção complexa. Apesar de os critérios anteriores serem eficazes na detecção da Demência, o último deu a todos os domínios cognitivos o mesmo peso.
É importante considerar que funções esta pessoa tinha capacidade de realizar anteriormente para se estabelecer a comparação.
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Caso não ocorra incapacidade social ou ocupacional, mas haja comprometimento de um ou mais domínios acima citados, excluindo os sensorimotores, podemos chamar de Declínio Cognitivo Leve ou MCI (Mild cognitive Impairment). Este paciente em geral terá queixas vagas e arrastadas que podem ser: perda de memória, alteração da atenção, alterações de linguagem, deterioração de habilidades visuo-espaciais. (PETERSEN, 2014)
Sendo assim, é muito importante atentar para causas de comprometimento cognitivo que são potencialmente reversíveis. Por isso, antes de encarar aquele déficit como normal, é MUITO importante que o idoso faça uma consulta ao seu médico
O que o médico deve procurar?
Em primeiro lugar, o paciente deve estar acompanhado de informante que o conheça bem, para que sejam avaliadas as queixas de perda de função que o paciente desconhece. É necessário investigar o histórico de medicamentos (especialmente analgésicos, anticolinérgicos, sedativo-hipnóticos), bem como substâncias de abuso.
Deve ser realizado exame clínico e neurológico minucioso, com avaliação do estado mental (pode ser utilizado o Mini-mental State Examination – MMSE, assim como muitos outros testes de screening disponíveis gratuitamente). Caso o declínio cognitivo seja leve, é altamente indicada a realização de teste neuropsicológico com profissional capacitado para identificar os domínios afetados e dar o diagnóstico mais preciso. É importante também pesquisa de fator clínico, e de déficits sensorimotores que possam ser causa potencial para instalação ou agravamento do quadro.
Não menos importantes são os exames laboratoriais a serem realizados, de acordo com a avaliação clínica. Entre eles estão: dosagem de hormônios tireoidianos, vitamina B12, Hemograma completo, eletrólitos, glicose, testes de função renal, hepática, folato, urinálise, VHS, FAN, PCR, sorologias para HIV, Lyme, pesquisa de sífilis, screen para metais pesados, cobre, ceruloplasmina.
Um exame de imagem, como TC de crânio ou Ressonância magnética, PET, SPECT, tem papel importante na verificação de alterações estruturais tanto que caracterizem uma causa secundária, a exemplo da hidrocefalia de pressão normal, ou ainda para diferenciar entre os tipos de demência. Dependendo do caso, podem ser solicitados até mesmo punção lombar, EEG e biópsia cerebral.
Excluídas todas as causas clínicas de possíveis fatores secundários que comprometam a função cognitiva do idoso, podemos pensar em causa primária de demência. Ainda assim, é muito importante reforçar a mudança de hábitos de vida, encorajando atividade física, redução da massa corporal para IMC<= 25, cessação do hábito de fumar, quando for o caso e estimular novos aprendizados.
A importância deste conhecimento é saber que existem muitos casos que chegam até mesmo a reverter o declínio cognitivo após tratamento, ou desaceleram sua progressão em anos, significando melhor qualidade de vida para o idoso e para sua família.
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Referências:
- DAVID S. KNOPMAN, MD; BRADLEY F. BOEVE, MD; AND RONALD C. PETERSEN, PHD, MD. Essentials of the Proper Diagnoses of Mild Cognitive Impairment, Dementia, and Major Subtypes of Dementia. Mayo Clin Proc. 2003;78:1290-1308
- R. C. PETERSEN , B. CARACCIOLO, C. BRAYN , S. GAUTHIER, V. JELIC & L. FRATIGLIONI. Mild cognitive impairment: a concept in evolution. The Association for the Publication of the Journal of Internal Medicine Journal of Internal Medicine, 2014, 275; 214–228
- American Psychiatric Association. Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders, Fifth Edition (DSM-5), American Psychiatric Association, Arlington 2013
- Claudia L Reardon, MD, Jerry L Halverson, MD. Screening for Cognitive Impairment Updated: Oct 09, 2017 – https://emedicine.medscape.com/article/1941498-overview#a4
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