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Neurologia26 junho 2024

Panorama geral da malformação de Chiari tipo 1

A malformação de Chiari tipo 1 é a mais comum, podendo ocorrer em crianças e em adultos, decorrente de processos congênitos ou adquiridos.
Por Danielle Calil

A malformação de Chiari é uma anomalia da fossa cerebral posterior descrita, pela primeira vez, em 1981. Embora sua característica fundamental seja o deslocamento inferior da tonsila cerebelar em relação à sua posição na fossa posterior, há outras possibilidades de configurações anatômicas nas quais diversos subtipos foram descritos.

A malformação de Chiari tipo 1 (CM1) é a mais comum, podendo ocorrer em crianças e em adultos, assim como ser decorrente de processos congênitos ou adquiridos. 

A New England Journal of Medicine, em 2024, traz uma revisão sobre esse tema, contemplando evidências de fisiopatologia, de manifestações clínicas, de diagnóstico e, por fim, de tratamento. 

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Close de estetoscópio, caneta e exame de malformação de Chiari

Fisiopatologia 

A malformação de Chiari pode ocorrer por uma causa congênita (mais comum) quando há um tamanho pequeno de fossa posterior, ou por uma causa adquirida quando há um aumento de pressão acima do cerebelo ou uma redução da pressão abaixo do cerebelo.

Em ambos os contextos, há um deslocamento da tonsila cerebelar para baixo do seu posicionamento habitual, podendo localizar-se abaixo do forame magno. A herniação da tonsila cerebelar abaixo de 5mm do forame magno é a definição usual para CM1. 

O deslocamento inferior da tonsila cerebelar para o forame magno pode resultar em obstrução do fluxo liquórico no quarto ventrículo.

Essa obstrução, por conseguinte, pode gerar uma dissociação do fluxo liquórico pulsátil normal entre os compartimentos do crânio e da medula espinhal, podendo resultar em cefaleia e na formação de cavidades liquóricas como o syrinx (cavidade que pode corresponder a uma siringo ou hidromielia).

Outras consequências dessa alteração anatômica é a compressão mecânica de regiões mais inferiores do bulbo e dos segmentos cervicais mais altos da medula espinhal.  

Manifestações clínicas 

Os sintomas de CM1 em adultos geralmente ocorrem em idade média aos 40 anos com uma predominância em mulheres (3:1); enquanto, por outro lado, em crianças a manifestação ocorre em idade média de 8 anos com prevalência similar entre os gêneros.  

O termo síndrome de Chiari refere-se a manifestações clínicas atribuíveis a esse deslocamento da tonsila cerebelar para o forame magno; podendo, portanto, serem sintomas diversos. 

O sintoma mais prevalente é cefaleia – geralmente resultado do aumento transitório de pressão intracraniana em decorrência do bloqueio parcial do fluxo liquórico. Essa cefaleia tende a estar localizada em região suboccipital com qualidade pulsátil (embora possa ocorrer em outras topografias e possuir outras qualidades de dor), sendo potencialmente exacerbada por atividades Valsalva-like (como tosse, riso, espirro, carregar objetos pesados ou alterações de posição cefálica). 

Outros sintomas potenciais, podendo ocorrer de modo independente ou associado à cefaleia, são as parestesias em mãos (sem distribuição radicular). A sua presença provavelmente é resultado da compressão do bulbo dorsal ou dos cornos posteriores dos segmentos medulares cervicais altos. Sintomas de parestesias podem também acometer os pés ainda que essa localização seja menos comum. 

Outras manifestações clínicas possíveis são: apneia do sono, tinnitus (que pode ser pulsátil), hipo ou hiperacusia, disfagia, nistagmo de origem central (podendo ocorrer de vários tipos, mas ressalta o tipo downbeat), paresia do olhar vertical, oscilopsia, visão turva e vertigem.  

Diagnóstico 

Embora o deslocamento inferior da tonsila cerebelar para o forame magno possa ser identificado em tomografia de crânio (TC), o exame de escolha para analisar malformação de Chiari é a ressonância magnética (RM) tanto do encéfalo (com destaque para imagens sagitais) como também de coluna cervical (para a detecção de syrinx). 

Como já mencionado, a característica fundamental para considerar CM1 é o deslocamento inferior de 5mm da tonsila cerebelar abaixo do forame magno. Há casos de herniação da tonsila cerebelar entre 3-5mm abaixo do forame magno no qual pode ser também classificado em CM1, na qual deve também apresentar presença de syrinx ou uma tonsila com formato peglike (formato em “pino”). 

Outro recurso no exame de ressonância, para avaliação de CM1, é a complementação com sequência de fluxo liquórico. Trata-se de técnica que avalia o fluxo liquórico no nível do quarto ventrículo e no forame magno, na qual normalmente é demonstrado fluxo liquórico bidirecional na sístole e na diástole cardíaca. Em CM1 sintomático, pode ocorrer comprometimento da dinâmica desse fluxo liquórico, podendo ser inclusive um fator preditivo para redução de sintomas após cirurgia.  

Saiba mais: Como estratificar pacientes com maior risco de convulsões?

Tratamento 

O principal objetivo do tratamento é aliviar o processo de compressão na junção cervicobulbar e normalizar o fluxo liquórico no nível do forame magno. 

Em casos de pacientes assintomáticos, cujos achados para CM1 foram encontrados de forma incidental em exames de neuroimagem, não há indicação de cirurgia se não houver presença de syrinx. Importante ressaltar que o manejo de casos assintomáticos de CM1 possui controvérsias; algumas diretrizes, inclusive, sugerem um follow-up próximo desses pacientes, com recomendação cirúrgica em casos de expansão da syrinx ou em surgimentos de sintomas atribuíveis à herniação da tonsila cerebelar. 

Em casos de neurocirurgia, os procedimentos cirúrgicos potenciais para descompressão da fossa posterior podem variar quanto à complexidade e à extensão. Essas potenciais técnicas neurocirúrgicas não apresentam superioridade de uma em relação à outra, de modo que na prática haja variação entre os cirurgiões e instituições. 

Os pacientes submetidos à cirurgia de descompressão de CM1 experimentam imediato alívio de parestesias de membros e de tinnitus, enquanto outros sintomas, como cefaleia, podem diminuir ou resolverem em torno de semanas a meses. 

As principais complicações pós-operatórias de descompressão de fossa posterior são meningite asséptica em casos de enxerto dural e fístula liquórica que podem ocorrer, respectivamente, em até 32% e 21% dos casos. 

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Referências bibliográficas

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