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Neurologia5 abril 2025

AAN 2025: Plenária de controvérsias em neurologia

Um dos grandes destaques do AAN 2025, foi a sessão Controvérsias em Neurologia, com discussão de temas atuais e controversos em neurologia.
Por Danielle Calil

Um dos grandes destaques do congresso da American Academy of Neurology 2025, foi a sessão plenária de Controvérsias em Neurologia. Essa sessão reúne especialistas para debater os temas mais atuais e controversos em neurologia. O formato inclui dois palestrantes defendendo lados opostos de um mesmo tópico, seguido por uma refutação, promovendo uma discussão aprofundada e multifacetada sobre questões complexas na área. A plateia interage ativamente, respondendo pelo aplicativo do congresso à pergunta após o debate, permitindo avaliar mudanças de opinião ao longo das apresentações. 

O diagnóstico de doença de Parkinson baseado em biomarcador:  estamos prontos para adotar uma definição biológica em termos de pesquisa? 

A palestrante Kathleen Poston foi responsável por defender a resposta afirmativa a essa pergunta, enquanto Paolo Calabresi apresentou argumentos contrários. 

A Dra Kathleen Poston defende o “sim” com a argumentação de que a definição biológica em doença de Parkinson (DP) é essencial para identificar indivíduos em fases pré-motoras da doença, o que seria uma condição obrigatória para delinear de prevenção ou terapias modificadoras de doença. Poston destacou, por exemplo, o uso de biomarcadores como o alpha-synuclein seed amplification assay (α-Syn-SAA), que já demonstraram acurácia superior ao diagnóstico clínico na identificação de corpos de Lewy em estudos post-mortem. 

Por outro lado, o Dr. Paolo Calabresi defendeu a resposta negativa, enfatizando que a DP deve ser compreendida como uma entidade clínico-biológica. Ele apresentou ressalvas em relação aos biomarcadores atualmente disponíveis, com destaque para o α-Syn-SAA. Seus principais pontos foram: (1) alto custo e limitada disponibilidade; (2) validade restrita à Doença de Parkinson, sem aplicabilidade a outros parkinsonismos; (3) natureza qualitativa – sem utilidade para estimar gravidade ou progressão da doença; (4) ausência de evidência quanto à sua utilidade como marcador de resposta terapêutica. Calabresi também argumentou que tais biomarcadores não capturam a complexidade clínica da DP nem explicam adequadamente seus mecanismos fisiopatológicos uma vez que a alfa-sinucleína por si é insuficiente para explicar toda a cascata etiopagênica. Por fim, ressaltou que a maioria dos estudos atuais é transversal, sendo imprescindível a realização de investigações longitudinais para uma validação robusta desses marcadores. 

O resultado da sessão refletiu a complexidade do tema e a divisão de opiniões na comunidade científica: a votação foi igualmente dividida, com 50% a favor e 50% contra a adoção de uma definição biológica da DP em termos de pesquisa.

Alvo pressórico no AVC hemorrágico: será que devemos reduzi-la ao máximo? 

A palestrante Chitra Venkatasubramanian defendeu a resposta afirmativa a essa pergunta, enquanto Kara Melmed apresentou argumentos contrários. 

A Dra. Chitra Venkatasubramanian defendeu um alvo pressórico sistólico inferior a 130 mmHg. Iniciou sua apresentação ressaltando a elevada morbimortalidade associada ao AVC hemorrágico (AVCh), destacando que a expansão do hematoma é um dos principais preditores independentes de pior desfecho funcional. Mencionou o estudo prospectivo longitudinal SAMURAI, publicado em 2022, no qual a expansão do hematoma foi menor em pacientes cujo alvo de pressão arterial sistólica (PAS) foi mantido abaixo de 130 mmHg. No ATTACH-2 trial, o grupo de tratamento intensivo, com PAS média de 128 mmHg (versus 141 mmHg no grupo controle), apresentou uma tendência à menor expansão do hematoma, embora sem atingir significância estatística (p = 0.09). Uma possível explicação para esse achado, segundo a palestrante, seria o tempo prolongado até o controle efetivo da pressão nos participantes do estudo. 

Por outro lado, a Dra. Kara Melmed argumentou a favor de um alvo pressórico entre 130 e 150 mmHg. Segundo ela, nenhum ensaio clínico randomizado demonstrou benefício funcional significativo com o controle pressórico intensivo em pacientes com AVCh intraparenquimatoso. Além disso, alertou para riscos associados à redução agressiva da pressão arterial, como a ocorrência de lesão renal aguda, que pode impactar negativamente na evolução clínica. A palestrante destacou, ainda, a diretriz atual da AHA/ASA, que recomenda como abordagem segura a manutenção da PAS entre 130 e 150 mmHg nesse contexto. 

Apesar das divergências, ambas as palestrantes concordaram em dois pontos essenciais: a necessidade de reduzir rapidamente a pressão arterial sistólica nos pacientes com AVCh, a fim de evitar a expansão do hematoma, e a importância de minimizar a variabilidade e flutuações da pressão arterial durante o manejo inicial. 

Ao final da sessão, a maioria da audiência votou pela resposta “não”, refletindo a cautela predominante em relação à adoção universal de metas pressóricas mais agressivas nesse cenário. 

Antagonistas de CGRP devem ser a primeira linha para o tratamento de migrânea? 

O palestrante Andrew Charles foi responsável por conduzir uma apresentação defendendo o “sim” à esta pergunta, enquanto a palestrante Elizabeth Loder conduziu o “não”. 

O Dr Andrew Charles iniciou sua argumentação citando as terapias profiláticas pregressas de migrânea como classes de anti-epilépticas, beta-bloqueadores, anti-hipertensivos e antidepressivos. Essas indicações falham em alguns aspectos como as classes de anti-hipertensivos e antidepressivos não serem aprovadas pelo FDA para migrânea em específico ou falham em aspectos de segurança como a classe de anti-epilépticos (ex. valproato de sódio e seu efeito teratogênico em mulheres em idade fértil). Por outro lado, o desenvolvimento dos antagonistas de CGRP apresentam algumas vantagens como atuação na fisiopatologia da doença, possuem ensaios clínicos randomizados controlados por placebo que demonstram seus benefícios, possuem estudos que suportam seu benefício com dados de “vida real” além de sua boa tolerabilidade. Inclusive, outro ponto abordado foi a publicação da International Headache Society colocando esses antagonistas CGRP como terapias de primeira-linha para migrânea. Uma cautela realizada pelo palestrante foi defender que os antagonistas de CGRP sejam considerados como opção de primeira-linha, mas que isso não implica que estes devam ser considerados como primeira opção de uma abordagem terapêutica. 

Já a Dra Elizabeth Loder iniciou sua alegação comentando o significado para o termo “primeira-linha” que seria correspondente à preferência e à primeira escolha padrão. Com base nesse racional, a palestrante defende que os antagonistas CGRP não devem ser considerados “padrão” ou “primeira linha”, visto que possuem um alto custo financeiro, talvez não atendam em termos de “custo-efetividade” e não possuem uma melhor efetividade significativa comparada às terapias alternativas. Ademais, em populações especiais como gestantes, não há ainda dados suficientes sobre segurança dos antagonistas de CGRP.   

Na votação interativa da plateia, a resposta mais votada foi “não”. 

Comentários finais 

A plenária de controvérsias da AAN se destaca como um espaço dinâmico e essencial para o debate crítico na neurologia. Ao reunir especialistas com opiniões divergentes e envolver ativamente o público, a sessão estimula a reflexão e contribui para decisões clínicas mais embasadas diante de temas complexos e em constante evolução. 

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Referências bibliográficas

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