Efetividade e segurança do uso de rituximabe em baixas doses
O termo miopatias inflamatórias idiopáticas (IIM) refere-se a um grupo de doenças cuja característica em comum principal é o acometimento inflamatório autoimune da musculatura estriada. Estão incluídas a dermatomiosite, a polimiosite, a síndrome antissintetase, a miopatia necrosante imunomediada, a miopatia associada ao câncer e a miopatia por corpos de inclusão. Além da miosite propriamente, diversas outras manifestações, como cutâneas, pulmonares, articulares, gastrointestinais, entre outras, podem estar presentes em combinações variadas.
Os casos refratários de IIM são raros, mas trazem uma complexidade ainda maior ao tratamento, dadas a ausência de evidências científicas de alta qualidade metodológica e a falta de recomendações universalmente aceitas para o seu manejo. Nesse contexto, o uso de rituximabe (RTX) como terapia de indução da remissão vem sendo considerado para o.
De modo a agregar novos dados a esse cenário, Gamba et al. conduziram um estudo cujo objetivo foi avaliar a utilização do rituximabe em dose padrão e em baixas doses no tratamento dos pacientes com IIM refratária.
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Métodos
Trata-se de um estudo retrospectivo de centro único (Hospital Universitário de Pádua, Itália) que revisou todos os pacientes com IIM que foram prospectivamente acompanhados de 01/01/2008 a 30/06/2023.
Os critérios de inclusão foram: uso de RTX endovenoso pelo menos 1 g, preenchimento de critério de classificação (Bohan e Peter, ENMC ou 2017 ACR/EULAR) e presença de doença refratária. Os critérios de exclusão foram: ausência de avaliação clínica 6 a 12 meses após administração do rituximabe ou ausência de dados adequados para avaliação.
A dose padrão de rituximabe foi a de duas infusões de 1 g nos D0 e D14; já as doses isoladas de 1 g a cada 6 meses foram definidas como baixas doses. Quando as doses eram programadas em 6 meses, receberam a denominação de programadas; as doses realizadas por atividade de doença foram chamadas de sob demanda. As pré-medicações utilizadas foram metilprednisolona 80 mg, clorfeniramina e paracetamol.
A resposta ao RTX foi estratificada conforme a manifestação:
- Pacientes com acometimento muscular: resposta parcial – redução de 30% na CK e aumento de 15% no MMT-8 ou MMT-8 >140/150; resposta completa – CK ≤180 e aumento de 20% no MMT-8 ou MMT-8 145/150;
- Pacientes com acometimento pulmonar: a resposta parcial e completa foram baseadas no julgamento do pneumologista, levando em consideração dados funcionais e radiológicos. TCAR foram realizadas antes e após o tratamento com RTX e anualmente; já prova de função pulmonar com DLCO foi realizada a cada 6 meses;
- Pacientes com acometimentos muscular e pulmonar combinados: a resposta completa foi considerada quando tanto os critérios de resposta completa para manifestações muscular e quanto pulmonar foram atingidos. Do contrário, o paciente foi considerado como resposta parcial.
- Pacientes com manifestações cutâneas e/ou articulares: respostas parcial e completa foram baseadas no julgamento clínico do médico assistente.
A reativação foi definida com base no julgamento dos médicos assistentes ou na necessidade de aumento de imunossupressão. Eventos adversos também foram avaliados.
Resultados
Foram incluídos 36 pacientes, sendo 69,4% do sexo feminino. A distribuição dos fenótipos foi: 41,7% polimiosite, 36,1% síndrome antissintetase, 16,7% dermatomiosite, 2,8% miopatia por corpos de inclusão e 2,8% miopatia necrosante imunomediada.
A positividade para anticorpos foi identificada em 26 pacientes (72,2%), com a seguinte distribuição: 33,3% anti-Jo1, 25,0% anti-Ro, 13,9% anti-SRP, 5,9% anti-PM/Scl, 5,9% anti-Mi2, 2,8% anti-PL7, 2,8% anti-TIF1gama, 2,8% anti-Ku, 2,8% anti-Sp100.
Os tratamentos previamente utilizados foram: metotrexato (72,2%), micofenolato mofetil (50,0%), IVIG (27,8%), azatioprina (22,2%), hidroxicloroquina (13,9%), ciclosporina (13,9%), leflunomida (11,1%), tacrolimo (2,8%), ciclofosfamida (2,8%).
Dos pacientes incluídos, 18 (50,0%) necessitaram do uso de RTX por acometimento muscular, 6 (16,7%) por doença intersticial pulmonar, 12 (33,3%) para acometimento muscular e pulmonar combinados. A resposta completa ocorreu em 69,4% dos pacientes que usaram RTX; já a resposta parcial ocorreu em 7 (19,4%) e a ausência de resposta ocorreu em 4 (11,1%) – taxa geral de resposta 88,8% (parcial + completa). Dos 25 pacientes que apresentaram resposta completa, 6 foram mantidos com doses baixas de RTX, preservando a resposta. Vinte e seis pacientes com resposta parcial e completa conseguiram reduzir as doses de corticoide.
Com relação às reativações, dos 19 pacientes que atingiram e mantiveram resposta completa com RTX em dose padrão, 63,2% foram tratados com estratégia sob demanda e 36,8% com tratamentos agendados. Dois pacientes (16,7%) do grupo sob demanda reativaram dentro de 12 meses após a infusão do RTX; o mesmo aconteceu com 1 paciente (14,2%) do grupo programado.
Os principais problemas relacionados à segurança foram devido a infecções. Nove (25%) dos pacientes apresentaram eventos adversos de interesse, sendo que 6 (66,6%) necessitaram de internação hospitalar.
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Comentários
Apesar de pequeno e de fornecer uma evidência de baixa certeza, esse estudo é um dos poucos a analisar a resposta ao RTX dos pacientes com IIM refratárias. Devemos lembrar que as IIM são doenças muito raras e que as formas refratárias são ainda mais raras. O RTX pareceu eficaz na indução da remissão e doses mais baixas foram úteis para manutenção. No entanto, devido às suas limitações metodológicas, estudos maiores, prospectivos, controlados e randomizados são necessários para conclusões mais definitivas.
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