Dores no pós-operatório de cirurgias de coluna
Dores no pós-operatório de cirurgias de coluna afetam cerca de 40% dos pacientes, são frequentes e podem ser intensas, principalmente nos primeiros dias.
Dores após cirurgias de coluna (ou síndrome dolorosa pós-laminectomia) são frequentes e podem ser intensas, principalmente, nos primeiros dias.
Cerca de 40% dos pacientes sentem dores após procedimentos cirúrgicos de região cervical, torácica ou lombar. O manejo adequado da dor nesse período está correlacionado com o melhor resultado funcional, deambulação precoce, alta precoce e prevenção do desenvolvimento de dor crônica.
As cirurgias mais comuns são laminectomias, discectomias, fusões espinhais, instrumentações, correção de escoliose e excisão de tumores espinhais. As cirurgias espinhais convencionais invasiva podem envolver extensa dissecção de tecidos, ossos e ligamentos subcutâneos. Dessa forma, a dor pós-operatória é um quadro esperado.
Segundo Biancon (2004), as dores podem ser intensas, com duração de 3 dias. Logo, o alívio da dor é um dos objetivos pós-operatórios. A necessidade é ainda mais evidente porque muitos pacientes que são submetidos a cirurgias trazem histórico prévio de dor. Assim, a percepção do desconforto pode se intensificar, sobretudo, se o paciente fez uso de opioides, analgésicos ou narcóticos convencionais.
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Principais causas de dores no pós-operatório
Dores após cirurgias de coluna são resultantes da ativação de diferentes mecanismos: nociceptivo, neuropático e inflamatório. Assim, a dor na região posterior pode ser originada em diferentes tecidos, como vértebras, discos intervertebrais, ligamentos, dura-máter, cápsulas das articulações, fáscia e músculos.
As prolongações nervosas nessas estruturas estão conectadas aos nervos simpático e parassimpático. Por isso, atrito, compressão ou inflamação pós-operatória podem provocar dor.
A existência de grande conectividade cruzada é motivo para surgimento de dor referida.
As principais causas para dores após cirurgias de coluna são o erro diagnóstico, a formação de fibrose peridural, inflamação na articulação sacroilíaca e dores musculares.
Um erro diagnóstico pode levar o médico a intervir em estrutura que não era a causadora da dor. Nesse caso, a dor pré-cirúrgica persiste após o procedimento.
Outra causa comum é a formação de fibrose peridural. Trata-se cicatriz interna que pode causar compressão dos nervos, com redução da irrigação sanguínea, provocando dor.
Já a inflamação na articulação sacroilíaca pode ocorrer após a alteração da biomecânica da região. O atrito entre a porção sacral da coluna e o osso ílio pode provocar artrose na articula e, assim, resultando em dor para o paciente.
Finalmente, as dores pós-cirúrgicas mais comuns são musculares. Podem ser provocadas por perda de tônus devido ao repouso excessivo ou por sobrecarga de alguns grupos musculares, resultando em síndrome dolorosa miofascial crônica com sensibilização periférica e central.
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Complicações
Uma das complicações das dores após cirurgias de coluna é o quadro chamado Dor Pós-Operatória Persistente (PPP, na sigla em inglês). Trata-se de dor crônica que surge após o procedimento cirúrgico. A Associação Internacional para o Estudo da Dor define como: dor desenvolvida após cirurgia, com pelo menos 2 meses de duração, sem outras causas e sem relação com um problema pré-existente.
Como ocorrem?
A dor pós-operatória persistente pode surgir por diferentes motivos, tais como: lesão miofascial, cicatrizes ósseas, sensibilização à dor, perda de tônus muscular na região. Embora sejam esperadas dores após cirurgias de coluna, há fatores que influenciam a frequência e a intensidade do surgimento deste quadro pós-operatório, que pode resultar em PPP.
Segundo estudo de Costelloe (2020), o surgimento de dores está relacionado com os seguintes fatores: comportamento de catastrofização da dor, aumento da sensibilidade aos estímulos dolorosos, sintomas de ansiedade, sintomas de depressão e uso pré-operatório de opioides.
A catastrofização da dor é um conceito que define as respostas desadaptativas e exageradamente negativas, com antecipação da dor. De acordo com o estudo, este é um marcador de vulnerabilidade psicológica e tem sido utilizado como um fator de predisposição à dor pós-operatória persistente.
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Preditores
Ansiedade é um dos principais preditores do desenvolvimento de dor crônica após cirurgia de coluna. Os sintomas de ansiedade têm correlação positiva com a ocorrência de fortes dores pós-operatórias tanto no curto, médio e longo prazo.
Depressão também é um fator relacionado com as dores crônicas pós cirurgia na coluna. Pacientes com altos escores em escalas de avaliação de sintomas depressivos, antes do procedimento, apresentam dores crônicas com maior frequência. Os resultados encontrados pelos pesquisadores tiveram como base avaliação de depressão com o uso do Beck Depression Inventory (BDI).
O uso de opioides antes da cirurgia é um dos fatores de predição do surgimento de dores crônicas. Além disso, também possui correlação com piores prognósticos. Estudo longitudinal de coorte, conduzido por Hills (2019), acompanhou a evolução dos casos de 2128 pacientes submetidos à cirurgia eletiva da coluna. Nesta pesquisa, os pacientes tratados com opioides antes da cirurgia foram significativamente menos propensos a alcançar melhorias significativas em 1 ano na dor, funcionamento e qualidade de vida.
Tratamentos
A prevenção precoce e tardia desta síndrome dolorosa é um desafio. Estudos indicam que uma mobilização precoce, controle de fatores secundários como diabetes mellitus, analgesia perioperatória adequada e procedimentos cirúrgicos com menos trauma e menor lesão de nervos são fatores que podem minimizar o processo inflamatório local e dor.
Opções farmacológicas
Existem diversas opções farmacológicas para a melhoria efetiva da síndrome pós-laminectomia. Cada uma dessas drogas possui vantagens e desvantagens inerentes que restringem sua aplicabilidade.
Portanto, a abordagem mais adequada pode ser uma terapia combinada ou analgesia multimodal para controle adequado da dor. As opções de medicamentos mais utilizadas, por via parenteral e oral, são: analgésicos narcóticos, anti-inflamatórios não esteroides e paracetamol.
Analgésicos narcóticos são medicamentos eficazes para o tratamento da dor intensa e costumam produzir excelentes resultados. No entanto, possui efeitos colaterais desagradáveis, como depressão respiratória, náusea, vômito e outros.
De acordo com Gottschalk (2011), a morfina é a terapia de primeira linha se não houver contraindicações ou efeitos adversos anteriores. A oxicodona é outra opção e, segundo os autores, proporciona melhor controle das alucinações.
Como a oxicodona possui efeitos adversos semelhantes aos da morfina, a metadona pode ser utilizada também. Sendo antagonista não competitivo do receptor de N-metil-D-aspartato (NMDA) mitiga a dor segundo Fishman (2002) e também reduz a tolerância aos opioides de acordo com Inturrisi (2002).
AINES
Os anti-inflamatórios não esteroides (AINES) atuam no bloqueio da enzima ciclooxigenase (COX) e a subsequente produção de prostaglandinas em vias inflamatórias. Eles têm eficácia comprovada na melhora da dor pós-operatória, demonstrada por Dumont (2000). Estudos de Nissen (1992), Reuben (1997) e Turner (1995) demonstraram a eficácia dos AINEs contra dor após cirurgias da coluna.
Paracetamol
O paracetamol, assim como a dipirona, é uma alternativa eficaz e mais barata para tratar a dor no pós-operatório; principalmente, quando administrado por via intravenosa. É útil no pós-operatório imediato, quando a motilidade gastrointestinal está reduzida ou quando é necessário o estabelecimento rápido de analgesia. A ação analgésica se inicia entre 5 a 10 minutos.
De acordo com estudo de Bajwa e Haldar (2015), os mecanismos de ação do paracetamol podem incluir: ação central e periférica; inibição de prostaglandinas; e inibição de vias serotoninérgicas descendentes. O paracetamol pode ser mais eficaz quando em terapia combinada com opioides.
Opções alternativas
A acupuntura e fisioterapia são opções de tratamentos não invasivos que devem ser consideradas no alívio da dor e relaxamento muscular, visando uma melhor funcionalidade e readaptação do paciente. A acupuntura tem importante efeito analgésico na síndrome dolorosa miofascial secundária a síndrome pós-laminectomia e pode ser considerada como opção de tratamento complementar para estes pacientes, principalmente para os que não toleram alta dose de analgésicos e/ou opioides.
Referências bibliográficas:
- Bianconi M, Ferraro L, Ricci R, Zanoli G, Antonelli T, Giulia B, et al. The pharmacokinetics and efficacy of ropivacaine continuous wound instillation after spine fusion surgery. Anesth Analg. 2004;98:166–72.
- Bajwa SJS, Haldar R. Pain management following spinal surgeries: An appraisal of the available options. 2015;6(3): 105–110. doi: 10.4103/0974-8237.161589
- Costelloe CC, Burns S, Yong RJ, Kaye AD, Urman RD. An Analysis of Predictors of Persistent Postoperative Pain in Spine Surgery. Current Pain and Headache Reports. 2020;24(11). DOI: doi.org/10.1007/s11916-020-0842-5
- Dumont AS, Verma S, Dumont RJ, Hurlbert RJ. Nonsteroidal anti-inflammatory drugs and bone metabolism in spinal fusion surgery: A pharmacological quandary. J Pharmacol Toxicol Methods. 2000;43:31–9
- Fishman SM, Wilsey B, Mahajan G, Molina P. Methadone reincarnated: novel clinical applications with related concerns. Pain Med. 2002;3:339–48
- Gottschalk A, Durieux ME, Nemergut EC. Intraoperative methadone improves postoperative pain control in patients undergoing complex spine surgery. Anesth Analg. 2011;112:218–23.
- Hills, J.M., et al., Preoperative opioids and 1-year patient reported outcomes after spine surgery. Spine (Phila Pa 1976), 2019;44(12):887-895. doi: 10.1097/BRS.0000000000002964.
- Inturrisi CE. Clinical pharmacology of opioids for pain. Clin J Pain. 2002;18:S3–13.
- Nissen I, Jensen KA, Ohrström JK. Indomethacin in the management of postoperative pain. Br J Anaesth. 1992;69:304–6.
- Reuben SS, Connelly NR, Steinberg R. Ketorolac as an adjunct to patient-controlled morphine in postoperative spine surgery patients. Reg Anesth. 1997;22:343–6.
- Turner DM, Warson JS, Wirt TC, Scalley RD, Cochran RS, Miller KJ. The use of ketorolac in lumbar spine surgery: A cost-benefit analysis. J Spinal Disord. 1995;8:206–12.
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