O que saber sobre o manejo de pacientes com fratura de múltiplos arcos costais
As fraturas de arcos costais (FAC) ocorrem em cerca de 10% dos pacientes vítimas de trauma e até 55% dos pacientes com trauma torácico contuso. Adicionalmente, embora a mortalidade por FAC isolada tenha decrescido nas últimas décadas, fatores como acometimento de múltiplos arcos costais, idade avançada e comorbidades associadas podem aumentar significativamente a taxa de mortalidade.
A dor decorrente do trauma é responsável pela restrição de movimentos torácicos adequados, que podem potencialmente ocasionar pneumonia, principal causa de mortalidade em pacientes com FAC. Por isso, a analgesia para manejo eficaz da dor continua sendo a principal ferramenta terapêutica nesses casos. A abordagem multimodal da dor incluindo medicações não opioides, bloqueios locorregionais e até crioablação de nervos intercostais tem sido utilizada para otimizar o controle álgico nesses pacientes, reduzindo morbidade.
Adicionalmente, nas últimas décadas, tem-se buscado otimizar a recuperação desses pacientes por meio da estabilização cirúrgica de fraturas de arcos costais (ECFAC). Dentre os principais benefícios dessa abordagem destacam-se redução, fixação e alinhamento para melhor cicatrização, além da otimização de controle álgico, permitindo melhor dinâmica torácica e reduzindo uso de analgésicos como opioides. Embora potencialmente benéfica, ainda não há consenso em relação às principais indicações dessa cirurgia. Por isso, revisaremos os principais critérios a serem considerados para manejo agudo do paciente vítima de FAC, incluindo indicação de ECFAC.
Triagem e critérios de internação hospitalar
O principal objetivo do tratamento deve ser o controle álgico, por isso, em pacientes com FAC que permanecem com dor significativa na realização de movimentos torácicos ventilatórios efetivos têm indicação de internação hospitalar para melhor controle álgico. Os com maior propensão à insuficiência respiratória (piora de parâmetros ventilatórios ou tórax instável) devem ser admitidos na UTI.
Indicações para estabilização cirúrgica de FAC
O manejo hospitalar multimodal da dor engloba utilização endovenosa intermitente de analgésicos simples e anti-inflamatórios não esteroidais (AINES), além da possibilidade de infusão de quetamina e lidocaína para reduzir uso de opioides. Quando disponível, pode-se também realizar bloqueio regional ou neuroaxial.
Nos pacientes em que o controle álgico não é atingido com terapia multimodal ou naqueles com injúrias severas e instabilidade da parede torácica está indicada a ECFAC, sendo esta a ferramenta cirúrgica para controle álgico e correção de instabilidade torácica. Estudos demonstram claro benefício desta abordagem em pacientes com falência respiratória por tórax instável, assim como redução de hemotórax retido pela possibilidade de acesso ao espaço pleural durante a abordagem costal.
Pacientes idosos (> 65 anos), em que há maior incidência de desfechos negativos, podem ser beneficiados com ECFAC com controle precoce de sintomas álgicos, redução de uso de opioides e tempo de internação hospitalar, o que pode potencialmente reduzir mortalidade. Também em pacientes com TCE e alteração do nível de consciência (ECG <8) e trauma torácico contuso com FAC também podem ser beneficiados com ECFAC.
Pacientes sem sinais de tórax instável, mas com pelo menos 3 arcos costais fraturados e com desvios significativos da fratura, também têm indicação de abordagem cirúrgica. Em casos de fraturas localizadas 2-3 cm do processo transverso vertebral, não há benefício na abordagem cirúrgica pela presença dos ligamentos paravertebrais que estabilizam as lesões.
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Como realizar a ECFAC
Idealmente a abordagem deve ser realizada em até 72 horas após o trauma, estando esse tratamento precoce associado a melhores desfechos. Para diagnóstico e identificação do padrão e severidade das lesões costais, a tomografia computadorizada (TC) é o exame de escolha. Reconstruções tridimensionais são úteis para planejamento cirúrgico.
Os dispositivos utilizados são usualmente placas de titânio fixados por parafusos. A técnica mais utilizada consiste na abordagem anterior poupadora de músculo para redução do segmento fraturado seguida de posicionamento e fixação da placa na linha de fratura para adequada cicatrização costal. O espaço residual antes da fixação da placa deve ser inferior a 1 cm para evitar deformação da prótese.
Posicionamento do paciente e tipo de incisão dependem da localização da fratura, sendo mais comum o decúbito lateral, que permite acesso ao local mais comum de fratura (linha axilar). A incisão deve ser planejada a partir de exames de imagem pré-operatórios, sendo preferida incisão vertical na linha de fratura em casos de acometimento de múltiplos arcos costais seriados. Em casos de tórax instável com fraturas distantes entre si, duas incisões verticais podem ser mais efetivas.
O que levar para casa
A ECFAC é uma abordagem potencialmente benéfica em pacientes com tórax instável e insuficiência ventilatória, podendo reduzir a morbimortalidade desse grupo. Também pode ser útil em pacientes com fraturas costais e dor refratária ao tratamento medicamentoso. Para outros perfis de pacientes a indicação de ECFAC permanece controversa, devendo-se ponderar custo-benefício, assim como características do paciente como idade e presença de lesão neurológica associada.
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