A obesidade é uma doença crônica definida pelo acúmulo excessivo de tecido adiposo com consequências negativas sobre resultados de saúde, incluindo aumento no risco de insuficiência cardíaca (IC), doença arterial coronariana e acidente vascular cerebral. Para indivíduos com IC, a perda de peso está associada à melhoria da saúde e redução de eventos, com evidências mais robustas nos pacientes com ICFEP, principalmente mediante o tratamento com semaglutida e tirzepatida. Fica claro que o manejo adequado da obesidade é essencial para melhorar os desfechos clínicos em pacientes com IC. Assim, o American College of Cardiology (ACC) publicou recentemente orientações atualizadas que abordam o diagnóstico, a avaliação de risco e o manejo da obesidade nesse grupo de pacientes.
Diagnóstico
O diagnóstico da obesidade em pacientes com IC tradicionalmente utiliza o índice de massa corporal (IMC) como medida principal. No entanto, o IMC apresenta limitações, especialmente em indivíduos com valores < 35 kg/m². Isso ocorre porque o IMC não diferencia entre massa magra e massa gorda, podendo subestimar a adiposidade em alguns casos. Assim, o ACC recomenda a incorporação de outras medidas, como a circunferência da cintura ou a análise da composição corporal, para uma avaliação mais precisa da obesidade.
Avaliação de Risco e Avaliação
A presença de obesidade pode complicar o diagnóstico de IC devido à redução dos níveis de peptídeos natriuréticos, como o BNP e o NT-proBNP, que são marcadores amplamente utilizados. Nesses casos, tais níveis podem estar artificialmente dentro da faixa de normalidade, levando a falsos negativos. Portanto, é fundamental manter um alto índice de suspeita clínica em pacientes com sintomas de IC, mesmo na presença de valores “normais” desses biomarcadores. O documento reforça que não existem limites específicos desses marcadores para indivíduos com obesidade.
Além disso, a avaliação deve incluir a identificação de condições concomitantes prevalentes em indivíduos obesos, como diabetes, hipertensão, distúrbios respiratórios do sono e fibrilação atrial. Essas comorbidades não apenas agravam a IC, mas também representam alvos terapêuticos importantes para melhorar a qualidade de vida e os desfechos clínicos.
Tratamento
O manejo da obesidade em pacientes com IC deve ser multifacetado, integrando abordagens comportamentais, farmacológicas e, em casos selecionados, intervenções cirúrgicas. Abaixo, detalham-se as estratégias recomendadas pelo ACC:
Estilo de Vida e Comportamental
Mudanças no estilo de vida são a base do tratamento. Incentivar a perda de peso por meio de modificações dietéticas e programas de atividade física adaptados às limitações impostas pela IC é essencial para melhorar o status funcional. Mesmo reduções consideradas modestas (-5%) têm impacto significativo em desfechos relacionados a IC. No entanto, o ACC reconhece que essas mudanças podem ser difíceis de implementar e sustentar, exigindo suporte contínuo e estratégias personalizadas.
Farmacológico
Para pacientes com IMC ≥ 30 kg/m² e IC com fração de ejeção preservada (ICFEP), os antagonistas do receptor GLP-1, como semaglutida e tirzepatida, emergem como opções promissoras. Esses medicamentos promovem perda de peso significativa, reduzem pressão arterial e inflamação. Nos estudos STEP-HFPEF e SUMMIT, semaglutida e tirzepatida, respectivamente, levaram a melhora de sintomas e da capacidade de exercício, além de reduzir um desfecho composto de piora de IC. Uma analise secundária do estudo SUMMIT demonstrou redução de pós carga, redução de PCR, NT-pro-BNP e troponina T, além de melhora na taxa de filtração glomerular e redução de albuminúria, sugerindo potenciais mecanismos relacionados aos benefícios encontrados. Durante a fase inicial de escalonamento da dose, é necessário monitorar a função renal e ajustar diuréticos, anti-hipertensivos e outros agentes antidiabéticos conforme apropriado.
Cirurgia Bariátrica
A cirurgia bariátrica é uma opção em pacientes com obesidade grave e IC. Estudos observacionais indicam que ela está associada a uma redução de eventos clínicos relacionados à IC. Contudo, essa população apresenta riscos elevados de morbidade e mortalidade cardiovascular pós-operatória. Assim, o ACC destaca a importância de otimizar as terapias para IC antes do procedimento e garantir o manejo pós-operatório por uma equipe multidisciplinar experiente em cuidados de IC.
Conclusão
As orientações do ACC fornecem um roteiro claro e baseado em evidências para o manejo da obesidade em pacientes com insuficiência cardíaca. A combinação de medidas biométricas precisas para o diagnóstico, avaliação cuidadosa de condições concomitantes e uma estratégia terapêutica que integra mudanças de estilo de vida, tratamentos farmacológicos como os antagonistas do GLP-1 e, em casos selecionados, cirurgia bariátrica, é essencial para melhorar os desfechos clínicos. Embora os avanços farmacológicos sejam promissores, eles devem complementar, e não substituir, as intervenções comportamentais e outras terapias baseadas em diretrizes, garantindo uma abordagem integral e eficaz.
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